Em meados dos anos 70 o programa espacial da União Soviética parecia continuar o caminho de exploração iniciado 10 anos antes com o épico voo de Yuri Gagarin. Poucos eram aqueles que poderiam apontar evidências da existência de um programa lunar tripulado que havia entrado em corrida directa com o Programa Apollo. Com a queda da União Soviética no início dos anos 90 foi finalmente revelada a verdade relativamente aos esforços soviéticos em colocar cosmonautas na Lua antes dos Estados Unidos.
Hoje em dia torna-se porém evidente que tudo não terá sido revelado. Desde sempre existiram inconsistências nas revelações feitas relativamente ao programa soviético e mesmo a principal fonte de informação, os diários de Kamanin, apresentam incongruências com os factos actuais.
A linha seguida pela União Soviética desde os primeiros anos após o fantástico anuncio do Presidente John F. Kennedy que colocou os Estados Unidos na corrida para a Lua, era a de que o país nunca teria respondido ao desafio americano e que jamais iria a arriscar a vida dos seus cosmonautas em missões perigosas para a Lua, missões essas que poderiam ser levadas a cabo por sondas automáticas que recolheriam amostras do solo lunar e as trariam para a Terra.
Na realidade a União Soviética possuía dois programas específicos para atingir o nosso satélite natural. O programa L1 tinha como objectivo colocar uma tripulação em órbita lunar, ou nas imediações da Lua, antes dos Estados Unidos. Por outro lado, o programa L3 pretendia atingir o solo lunar antes dos Estados Unidos, colocando na superfície um cosmonauta solitário. Como é sabido a corrida foi ganha pelos Estados Unidos em ambas as frentes com a Apollo-8, em Dezembro de 1968, e com a Apollo-11, em Julho de 1969. No entanto pode-se perguntar até que ponto a União Soviética esteve perto de bater os Estados Unidos na corrida à Lua. De facto, após analisar muitas evidências actuais, pode-se referir que no caso do voo circumlunar a distância que teria separado a missão soviética da Apollo-8 pode ser medida em escassas semanas ou mesmo em dias.
Ao lado: conceito do veículo L1 Podsadka utilizando o sistema de acoplagem Igla para a transferência de tripulação (o veículo superior é uma cápsula Soyuz). Imagem: Mark Wade (Encyclopedia Astronautica)
Qual a verdade?
Após a queda da União Soviética muitos cosmonautas e figuras eminentes do programa espacial soviético puderam finalmente revelar a verdade escondida ao longo de mais de 20 anos. No entanto, nos meses e mesmo alguns anos após o final do regime comunista, ainda existia uma linha de pensamento muito enraizada na matriz do partido que governara o país dos czares aos longo de décadas. Em resultado desta linha de pensamento, nem tudo teria sido revelado e ainda hoje persistem várias lacunas na História do programa espacial soviético e principalmente no que diz respeito ao seu programa lunar tripulado.
A linha seguida por muitas figuras teria sido de que os veículos e todo material destinado ao programa lunar, não eram suficientemente seguros para enviar cosmonautas para a Lua tanto antes da Apollo-8 como da Apollo-11. No entanto esta versão apresenta pontos inconsistentes. Como já foi referido, uma das principais fontes de informação sobre os passos e actividades espaciais soviéticas são os diários de Kamanin que foi o comandante do corpo de cosmonautas entre 1960 e 1971. Kamanin foi destituído do seu cargo após a tragédia da Soyuz-11 que vitimou Dobrovolsky, Volkov e Patsayev, porém foi a figura que mais insistiu na corrida espacial com os Estados Unidos tendo participado em todas as reuniões chave onde se decidiu o futuro do programa espacial tripulado soviético, tendo também assistido a todos os lançamentos tripulados.
Ao analisar os diários de Kamanin torna-se evidente que estes apresentam duas características importantes. A primeira é que os escritos se tratam realmente de pensamentos da época elaborados por Kamanin. Porém, outros escritos do diário são quase cópias de relatórios das comissões que preparavam os voos tripulados e muitas entradas parecem ter sido escritas baseadas em memórias do próprio Kamanin após ter sido dispensado. Torna-se assim estranho constatar que Kamanin não tenha estado presente em duas fases cruciais da corrida à Lua, nomeadamente em Dezembro de 1968 e em Julho de 1969.
A última janela de lançamento soviética que permitiria bater os Estados Unidos na órbita lunar é identificada por Kamanin no dia 26 de Novembro de 1968, como sendo entre 8 e 12 de Dezembro de 1968. Para os Estados Unidos, e devido às peculiaridades da mecânica orbital, a janela de lançamento para a Lua só estaria disponível duas semanas mais tarde. Nesta fase a União Soviética preparava afincadamente um veículo L1 para um voo lunar que seria lançado por um foguetão 8K82K Proton-K. Em preparação para o lançamento, Kamanin refere a 29 de Novembro de 1968 que terá lugar uma reunião da Comissão Estatal que irá ter em conta muita questões e aspectos fundamentais do programa lunar tripulado. De forma curiosa Kamanin refere que não estará presente nessa reunião pois terá de assistir a uma reunião do seu regimento da Segunda Guerra Mundial que terá lugar na Sibéria. Este ponto leva a colocar a questão acerca da veracidade deste facto, pois para alguém que acompanha o programa espacial soviético e a corrida à Lua com tal tenacidade é estranho não estar presente numa reunião que poderia decidir o futuro de tais programas. O diário retoma o relato de Kamanin a 7 de Dezembro de 1968 e nesta altura só refere questões administrativas relacionadas com o centro de treino de cosmonautas. Só de forma muito superficial Kamanin reflecte sobre o facto de a União Soviética estar a perder a corrida para a Lua.
Uma situação semelhante ocorre por altura da primeira missão lunar tripulada americana. Ambos os programas espaciais se encontram em frenética actividade. O lançamento da Apollo-11 estava programado para o dia 16 de Julho de 1969, enquanto que as actividades no cosmódromo NIIP-5 Baikonur antecipam o lançamento do segundo gigante N1 e de uma sonda Luna (Ye-8-5). O N1 transportava uma carga que até aos nossos dias não se encontra bem definida, enquanto que a sonda Luna deveria fazer a recolha de amostras do solo lunar e transportá-las para a Terra antes do regresso dos heróis da Apollo-11. Mais uma vez os diários de Kamanin apresentam algumas curiosidades. A última referência no diário antes da missão Apollo-11 acontece a 7 de Julho de 1969, sendo só retomado a 20 de Agosto de 1969 após um misterioso período de férias de Kamanin de 40 dias.
Sem dúvida que todas estas falhas na História do programa espacial, também existentes em outras personalidades que relataram a aventura espacial soviética, fazem persistir os rumores acerca de factos que ainda possam continuar escondidos.
Investigações levadas a cabo em 2004 por Charles Vick e Peter Pesavento que foram então apresentadas nas últimas edições da revista americana Quest, levam a supor a existência de dois cenários para o programa L1. Estes dois cenários apontavam para: 1) um lançamento directo para a Lua utilizando um foguetão 8K82K Proton-K equipado com um estágio Block-D para lançar a cápsula L1 (colocando-a numa trajectória trans-lunar); ou 2) a utilização de um foguetão 8K82K Proton-K para colocar o conjunto L1 / Block-D numa órbita terrestre baixa seguido pelo lançamento de um foguetão 11A511 Soyuz que colocaria em órbita terrestre baixa uma cápsula Soyuz tripulada por três cosmonautas e que teria como objectivo realizar um encontro e acoplagem com o L1 / Block-D. Após a acoplagem dois cosmonautas passariam para o veículo L1 através de uma actividade extraveícular e seriam propulsionados para a Lua pelo Block-D, com o terceiro cosmonauta na Soyuz a regressar então sozinho à Terra.
Segundo Vick e Pesavento, este cenário teria a designação “Podsadka” que em russo se refere a alguém que ajuda outra pessoa a montar um cavalo!!!
Ao lado: desenho esquemático do veículo L1 acoplado com um estágio Block D. Imagem: Mark Wade (Encyclopedia Astronautica)
O primeiro cenário, isto é um lançamento directo para a Lua, era o preferido pelas autoridades espaciais soviéticas, sendo o cenário mais simples. O segundo cenário, com um duplo lançamento, seria a alternativa suplente a ser utilizada caso o lançador 8K82K Proton-K fosse julgado pouco fiável para ser tripulado por cosmonautas.
A 27 de Abril de 1966 o governo soviético autoriza a produção de 19 veículos L1 dos quais 14 são destinados para um voo directo para a Lua e 5 são destinados ao segundo cenário referente aos lançamentos duplos.
Cenários semelhantes foram criados para o programa L3 que tinha como objectivo colocar a bandeira dos sovietes na superfície lunar. Este programa utilizava o foguetão N1 que caso não fosse suficientemente fiável para ser tripulado seria utilizado para somente colocar o veículo L3 numa órbita terrestre baixa que aguardaria a chegada de uma cápsula Soyuz com a sua tripulação. Da mesma forma a tripulação seria constituída por três cosmonautas dos quais dois passariam por actividade extraveícular para o veículo L3 (o terceiro cosmonauta regressaria então à Terra) e que seguiriam para a órbita lunar. Aqui, um dos cosmonautas passaria por actividade extraveícular para o módulo lunar e desceria para a posteridade para a superfície lunar aguardando no seu regresso a glória e uma parada na Praça Vermelha em Moscovo.
Tanto o veículo L1 como o veículo L3 foram desenvolvidos para transportar somente dois cosmonautas que era o número que executaria a actividade extraveícular desde a cápsula Soyuz.
Na primeira reunião da Comissão Estatal para o lançamento do veículo L1 levada a cabo a 24 de Dezembro de 1966, ainda existiam planos para as missões “Podsadka” em caso de falhas no lançador Proton. Em Janeiro de 1967 os cosmonautas são organizados em três grupos de treino que se referem aos diferentes tipos de missões que na altura estavam programadas: um grupo iria treinar para as missões em órbita terrestre utilizando as cápsulas 7K-OK Soyuz, um grupo em treino para as missões L1 “Podsadka” e um terceiro grupo para as missões L1 que previam um lançamento directo para a Lua.
Tudo parecia correr como planeado em Março de 1967 com a Soyuz e a L1 a levarem a cabo os seus primeiros voos de ensaio não tripulados. Nesta altura Kamanin refere que se encontram em produção 13 veículos L1 destinados a um voo directo para a Lua antes do 50.º aniversário da revolução soviética em Outubro de 1967. Curiosamente não existe qualquer referência às missões “Podsadka” nos planos de Kamanin e estes veículos não se encontram referidos no decreto original do lançador N1.
Porém, estes planos sofreriam um rude golpe em Abril de 1967 com o desastre da Soyuz-1 e a morte do cosmonauta Vladimir Komarov. Todos os lançamentos da Soyuz e da L1 eram adiados, tendo que o sistema de recolha da cápsula ser totalmente redesenhado e novamente qualificado para voo.
O foguetão Proton havia sofrido apenas uma falha em seis lançamentos até Maio de 1967 e no dia 6 Kamanin refere uma proposta de somente serem levadas a cabo as missões directas para a Lua. Nesta altura, e com a quase perfeita fiabilidade do Proton, as missões “Podsadka” eram consideradas desnecessárias. A 5 de Junho de 1967 a Comissão Estatal confirma a decisão em se concentrar na preparação dos voos L1 directos para a Lua. Nesta altura eram os problemas com o desenvolvimento dos veículos L1 que atrasavam o programa e nesta fase, com a concentração nos voos directos, desaparecem todas as referências aos veículos destinados às missões “Podsadka”.
Desenho do veículo L1 Podsadka realizado por Mark Wade após os conceitos de Charles Vick para uma escotilha insuflável que permitiria a transferência de tripulação pelo exterior dos dois veículos. Imagem: Mark Wade (Encyclopedia Astronautica)
Toda esta situação estava alterada quando os voos dos veículos L1 foram retomados em Setembro de 1967, pois o lançador Proton havia falhado em 3 dos 4 lançamentos realizados desde Maio de 1967 até Abril de 1968 e o programa lunar Apollo ganhava momento após o acidente com a Apollo-1 que vitimara Virgil Grissom, Edward White e Roger Chaffee na plataforma de lançamento durante um ensaio de rotina.
Parecia que esta altura seria a altura ideal para reactivar os planos para as missões “Podsadka”, porém os escritos de Kamanin permanecem silenciosos sobre tais planos.
Ao mesmo tempo que se procedia ao desenvolvimento dos veículos lunares eram levadas a cabo missões tripuladas em órbita terrestre utilizando as cápsulas Soyuz. Estas missões eram únicas e envolviam a acoplagem e transferência de tripulações. Desde cedo se tornaram curiosas para os observadores do programa espacial soviético, pois não viam qualquer razão para que as tripulações procedessem a uma transferência através de actividade extraveícular e era também curioso o porquê de se despender um esforço tão grande na realização destas missões quando este esforço deveria ser conduzido para a concretização de um voo lunar tripulado. Qual seria a razão para que os programas L1 e L3 não tivessem uma prioridade absoluta nesta altura? Nem mesmo os participantes no programa o sabem responder…
No entanto, é curioso verificar que se os voos “Podsadka” fossem considerados como uma alternativa para bater os americanos na corrida para a Lua, então estas missões Soyuz fazem todo o sentido nesta fase do programa espacial soviético. Nestas missões duplas a primeira Soyuz tripulada por um único cosmonauta era colocada em órbita terrestre e aguardava a chegada de uma segunda Soyuz tripulada por três cosmonautas. Este último veículo era considerado como veículo activo, enquanto que a primeira Soyuz era considerada como veículo passivo. Os três cosmonautas activavam o sistema Igla de encontro e acoplagem, levando a cabo uma manobra automática que terminava com a junção dos dois veículos em órbita. Esta acoplagem deveria ocorrer na primeira órbita após a inserção orbital do segundo veículo. Após a acoplagem dois dos cosmonautas do segundo veículo levariam a cabo uma saída para o exterior, transferindo-se para a primeira Soyuz (veículo passivo). Estas manobras eram exactamente o que deveria ser levado a cabo durante uma missão dupla “Podsadka” quer para o programa L1 quer para o programa L3. De salientar que o estágio Block-D utilizado tanto no programa L1 como no programa L3 utilizava oxigénio líquido (propolente criogénico) que tem a tendência para se evaporar rapidamente. Assim, era vital de concretizar rapidamente uma acoplagem entre os dois veículos em órbita e a consequente transferência de tripulação.
Após a Apollo-8 ter orbitado a Lua pela primeira vez a 24 de Dezembro de 1968, os soviéticos adoptaram um processo de encontro acoplagem em órbita terrestre muito mais lento envolvendo um dia de manobras orbitais antes da acoplagem. No entanto é evidente que o sistema de encontro e acoplagem Igla foi desenvolvido de forma a se proceder e permitir um rápido encontro e acoplagem em órbita.
Outros aspectos que apoiam esta teoria são o facto de desde cedo terem surgido esquemas do veículo L1 onde surgem estranhas estruturas na zona frontal do veículo. Durante muitos anos sugeriu-se que estas estruturas seriam colares de acoplagem que poderiam ser utilizados para juntar dois veículos em órbita terrestre e que seriam descartados após a injecção numa trajectória trans-lunar. Outros observadores sugeriam que estas estruturas serviriam para segurar o veículo ao dispositivo de salvamento de emergência no caso de um lançamento correr mal. Tendo o L1 um problema grave de excesso de peso, não parecia muito lógico transportar uma massa de 180 kg até à órbita terrestre. Entretanto em 1996 é revelado que toda a instrumentação (albergado no que parece ser um cone na parte frontal do veículo) serviria para sistemas de distribuição electrónicos do dispositivo suplente de fornecimento de energia do sistema de abortagem de voo. Assim, parecia mais lógico transportar este sistema até à órbita terrestre onde seria descartado.
Posteriormente surgiram outros desenhos e esquemas que mostravam outras variantes dos dispositivos localizados na zona frontal do veículo. Após a análise desses desenhos, Charles Vick e Peter Pesavento propuseram que de facto os dispositivos seriam parte de uma escotilha curva que seria utilizada para a transferência dos cosmonautas entre o veículo Soyuz e o L1.
Uma fantástica revelação é feita por Vick e Pesavento quando referem que os fatos espaciais Yastreb utilizados para a transferência extraveícular entre veículos Soyuz foram de facto desenvolvidos para serem utilizados a bordo dos veículos L1. Curiosamente até esta altura pensava-se que as tripulações a bordo do L1 não utilizavam fatos espaciais. O facto de os fatos Yastreb terem sido desenhados para serem utilizados a bordo do L1 coloca as missões Soyuz em completo contexto com as missões duplas “Podsadka” para os programas L1 e L3.
Utilizando estas últimas evidências, Vick e Pesavento ligam o programa Soyuz aos programas L1 e L3, dando ainda evidências acerca dos intensos esforços por parte da União Soviética para lançar tanto uma missão “Podsadka” envolvendo um veículo L1 e um veículo Soyuz em Dezembro de 1968.
Para a Lua antes dos EUA
Ao estudarem fotografias obtidas pelos satélites espiões Corona recentemente desclassificadas, Vick e Pesavento conseguem demonstrar a ocorrência de uma frenética actividade no cosmódromo NIIP-5 Baikonur durante o mês de Dezembro de 1968. Apesar de não existirem fotografias entre o período de 8 a 12 de Dezembro, altura da janela de lançamento para a Lua, fotografias obtidas no dia 15 de Dezembro mostram um foguetão 11A511 Soyuz com uma cápsula Soyuz no complexo 17P32-5 (LC1 PU-5) e a estrutura de uma das plataformas utilizadas para os lançadores Proton colocada em posição de suporte apesar de não estar qualquer lançador deste tipo na plataforma. Uma semana mais tarde, a 22 de Dezembro, o lançador 11A511 Soyuz está a ser removido da plataforma de lançamento, mas um foguetão 8K82K Proton-K encontra-se na plataforma de lançamento transportando um veículo L1. Todas estas movimentações parecem claramente indicar uma tentativa de bater os americanos até ao dia ou mesmo após o lançamento da Apollo-8. Ambos os autores teorizam que um duplo lançamento para a Lua utilizando o cenário “Podsadka” foi tentado nestes dias, mas que algum problema sério deverá ter impedido o lançamento do Proton.
A 25 de Dezembro de 1968 a Apollo-8 regressa da órbita lunar e a primeira corrida à Lua é ganha pelos Estados Unidos. As missões L1 são canceladas, pois nesta altura já não possuíam qualquer significado a nível de propaganda política para a União Soviética. No entanto os soviéticos ainda possuíam uma hipótese de bater os americanos na superfície lunar cuja missão estava prevista para 16 de Julho de 1969.
Apesar do veículo L3 não se encontrar pronto para levar a cabo uma missão na superfície da Lua, foram elaborados planos para, utilizando uma série de lançadores N1, colocar veículos L1 em órbita lunar e ao mesmo tempo levar a cabo o lançamento de várias sondas não tripuladas com foguetões 8K82K Proton-K. Existiam dois tipos de sondas: os veículos Lunokhod (Ye-8) que poderiam percorrer a superfície da Lua e servir de sinal para as sondas Luna (Ye-8-5) que deveriam alunar suavemente e recolher as amostras, regressando de seguida à Terra de preferência antes da missão tripulada americana.
O sexto mês de 1969 passou sem qualquer resposta soviética em relação à missão Apollo-8 e às restantes missões lunares, especialmente em relação ao eminente lançamento da Apollo-11 que deveria colocar os primeiros homens na superfície lunar.
Ao lado: a 3 de Julho de 1969 dá-se o lançamento do segundo N1 (11A52 nº 5L). O veículo elevou-se pouco mais de 200 metros quando todos os motores deixaram de funcionar. O sistema de emergência afastou o veículo L1S nº 5 do lançador que começou a cair sobre a plataforma de lançamento explodindo com tal violência que provocou danos na plataforma adjacente e num raio de centenas de metros. Imagem: Arquivo fotográfico do autor.
Apesar de já não possuírem qualquer proveito político, a União Soviética ainda tentou levar a cabo uma missão L1 não tripulada em Janeiro de 1969. Porém, também esta missão acabou por fracassar. O mesmo aconteceu com o primeiro lançamento do gigante N1 em Fevereiro de 1969 quando o lançador viu todos os seus motores do primeiro estágio serem desactivados após uma falha no sistema de controlo. As seguintes missões para tentar colocar um veículo Lunokhod na superfície lunar e para levar a cabo uma recolha de amostras do solo com uma sonda Luna (Ye-8-5) fracassaram devido a problemas com o lançador 8K82K Proton-K.
O derradeiro esforço final foi levado a cabo em Julho de 1969, estando previstos o lançamento do segundo N1 e de uma sonda Luna (Ye-8-5) destinada a recolher amostras da superfície.
Oficialmente o foguetão N1 transportava um veículo L1S que deveria orbitar a Lua e enviar fotografias da sua superfície. No entanto e de acordo com informações publicadas já em 1974, os soviéticos pretendiam levar a cabo uma missão tripulada. O veículo L1S deveria ser colocado numa órbita terrestre baixa onde aguardaria a chegada de um veículo Soyuz tripulado. Os dois veículos iriam acoplar e proceder-se-ia à transferência de tripulação da Soyuz para a L1S que depois partiria para a Lua. Após chegar à órbita lunar, a tripulação iria observar a alunagem de uma sonda Luna (Ye-8-5) que recolheria amostras da superfície e regressaria à Terra, tirando assim algum significado à primeira missão lunar tripulada.
Esta missão era na realidade a recuperação das missões “Podsadka” previstas para os voos L1. Este cenário teria sido já descrito por vários autores no início dos anos 70, tal como Vick e Pesavento mostraram. De facto, Korolev havia em tempos previsto a realização de missões para a Lua utilizando veículos montados em órbita terrestre. O que não deixa de ser intrigante é o facto de que a existência das missões L1 “Podsadka” ter sido só conhecida em 1995.
No dia 3 de Julho de 1969 tudo se encontrava pronto para o lançamento do segundo N1 (11A52 nº 5L). Os motores do primeiro estágio do gigantesco foguetão entraram em ignição, mas logo nos primeiros segundos algo de errado aconteceu com um dos motores. O veículo elevou-se pouco mais de 200 metros quando todos os motores deixaram de funcionar. O sistema de emergência afastou o veículo L1S nº 5 do lançador que começou a cair sobre a plataforma de lançamento explodindo com tal violência que provocou danos na plataforma adjacente e num raio de centenas de metros.
Dez dias após este violento desastre com o segundo N1 deu-se o lançamento com sucesso da sonda Luna. Após uma viagem até à órbita lunar o aparelho levou a cabo uma série de manobras orbitais em preparação para alunagem, porém tal não teria lugar pois o veículo acabaria por se despenhar na superfície.
Quem seria o primeiro soviético na Lua?
Quem seriam os cosmonautas que participariam numa missão lunar em Julho de 1969? No dia 18 de Junho de 1969 Kamanin indica que um grupo de cosmonautas composto por Bykovsky, Khrunov, Leonov, Makarov, Patsayev, Rukavishnov, Voronov e Yeliseyev, se encontram a treinar para uma missão à superfície lunar. Nas suas investigações, Vick e Pesavento tentam descortinar o paradeiro dos cosmonautas em Julho de 1969 chegando à conclusão que Bykovsky, Gorbatko e Khrunov seriam os cosmonautas que provavelmente participariam na missão lunar (Vick e Pesavento referem também que Kuklin, Leonov e Makarov se encontram em Baikonur, apesar de considerarem pouco provável a participação de Leonov em tal missão pois um mês antes encontrava-se de visita oficial ao Japão onde não teria seguido a linha oficial referindo aos jornalistas que seriam lançados veículos tripulados e não tripulados para a Lua por volta de Março de 1970).
Ao lado: um veículo lunar L1 durante a fase de montagem. É de notar a grande quantidade de instrumentação colocada no topo do veículo e a escotilha lateral que permitiria a entrada no veículo. Possivelmente esta imagem retrate uma cápsula Podsadka. Imagem: RKK Energia
Vick refere que Khrunov lhe relatou que se encontrava no cosmódromo por altura do segundo lançamento do N1 e que teria chorado quando viu o veículo explodir, compreendendo que a corrida para a Lua estava definitivamente perdida. Seria esta uma reacção ao lançamento de um veículo não tripulado? De qualquer das formas a destruição do N1 significava que o lançamento de qualquer tripulação estava cancelado.
Quase um “photo-finish”
A corrida para a Lua foi disputada até aos últimos dias. Oficialmente a União Soviética nunca enveredou por uma corrida à Lua referindo que jamais arriscaria a vida dos seus cosmonautas em façanhas tão perigosas que poderiam ser levadas a cabo por veículos automáticos não tripulados. O ocidente acreditou nesta posição soviética durante muitos anos chegando-se mesmo a referir que o dinheiro despendido pelos Estados Unidos nas suas missões lunares tripuladas teria sido gasto em vão pois nunca existira qualquer corrida à Lua.
Porém, desde os primeiros dias alguns observadores apontaram em outra direcção baseados em escassos dados inadvertidamente libertados pelos censores soviéticos. Notavelmente, Charles Vick sempre referiu a existência de um enorme programa secreto e totalmente dissimulado para colocar um cosmonauta soviético na Lua.
A União Soviética esteve sempre na corrida para a Lua, mas perdeu. Mas somente agora, Charles Vick e Peter Pesavento mostram o quão perto esteve a União Soviética de ganhar esta corrida.
Artigo baseado em trabalhos de Charles P. Vick e Peter Pesavento