A Organização de Investigação Espacial Indiana, ISRO, realizou o seu primeiro lançamento orbital de 2025 colocando em órbita com sucesso um novo satélite de navegação de segunda geração, o NVS-02.
O lançamento teve lugar às 0053UTC do dia 29 de Janeiro de 2025 e foi realizado pelo foguetão GSLV-MkII F15 a partir da Plataforma de Lançamento SLP (Second Launch Pad) do Centro Espacial Satish Dawan SHAR, Ilha de Sriharikota.
Este é o 17.º voo do lançador GSLV e o 11.º voo do estágio superior criogénico inteiramente desenvolvido na Índia, sendo a sua 8.ª missão operacional. Nesta missão, o lançador utilizou uma carenagem metálica com um diâmetro de 3,4 metros para acomodar o satélite NVS-02. Este lançador utiliza a segunda versão do denominado CUSCE = Cryo Upper Stage Control Electronics, CUSCE-V2, um novo sistema de controlo electrónico do estágio criogénico.
O objectivo do lançador foi o de colocar a sua carga numa órbita com um perigeu a 170 km e um apogeu a 36.577 km, com uma inclinação de 20,79.º (±0,1.º). O lançamento utilizou um azimute de voo de 106.º a partir da plataforma de lançamento.
Horas após o lançamento, o satélite deveria utilizar o seu próprio sistema de propulsão para elevar o seu perigeu orbital, colocando-se numa órbita geossíncrona. Porém, uma falha nas válvulas do sistema de abastecimento impediu a realizaçao desta manobra, com o satélite a ficar «preso» na sua órbita inicial. A ISRO está a estudar os procedimentos a realizar no futuro e qual a utilidade do satélite nesta órbita.
Este foi o 100.º lançamento espacial realizado a partir do Centro Espacial Satish Dawan SHAR, Ilha de Sriharikota, tendo em conta os váriois lançamentos orbitais e suborbitais realizados a partir das duas plataformas de lançamento.
O satélite NVS-02
Uma das marcas dos nossos dias no desenvolvimento espacial parece ser o facto de cada nação possuir o seu próprio sistema de navegação. Se os Estados Unidos iniciaram há já muitos anos o desenvolvimento do sistema GPS, a então União Soviética respondeu com o sistema GLONASS, seguindo-se o chinês Beidou / Compass e o europeu Galileo. O satélite NVS-02 era anteriormente designado “IRNSS-1K”.
A Organização de Investigação Espacial Indiana A Organização de Investigação Espacial Indiana (Indian Space Research Organisation, ISRO) é a agência espacial da Índia. A organização está envolvida na ciência, engenharia e tecnologia para colher os benefícios do espaço exterior para a Índia e para a humanidade. A ISRO é uma componente importante do Departamento Espacial do Governo da Índia. O departamento executa o Programa Espacial Indiano principalmente através de vários centros ou unidades dentro da ISRO. |
O sistema de navegação Navigation with Indian Constellation
O sistema de navegação ‘NavIC’ – Navigation with Indian Constellation – é, ao contrário de outros sistemas de navegação, um sistema de geoposicionamento regional cujo primeiro de sete satélites do seu segmento espacial, o IRNSS-1A, foi colocado em órbita a 1 de Julho de 2013. O sistema é também conhecido pela designação “Indian Regional Navigation Satellite System” (IRNSS).
O sistema foi concebido para fornecer serviços precisos de posição, velocidade e tempo (Position, Velocity and Timing, PVT) aos utilizadores na Índia, bem como na região que se estende por cerca de 1.500 km para além da massa terrestre indiana, que é o seu serviço principal. A área de serviço alargada encontra-se entre a área de serviço primária e o rectângulo constituído entre a latitude 30.º S a 50.º Norte e longitude 30.º Este e 130.º Este.
O NavIC fornece dois tipos de serviços: o SPS (Standard Positioning Service) e o RS (Restricted Service). Enquanto o SPS é fornecido a todos os utilizadores, o serviço RS (tratando-se de um serviço encriptado) será apenas fornecido aos utilizadores autorizados. Espera-se que o sistema IRNSS seja capaz de proporcionar uma precisão de mais de 20 metros na sua área principal de serviço.
Prevê-se que cinco satélites NavIC de segunda geração, nomeadamente NVS-01 a NVS-05, aumentem a constelação da camada base NavIC com características melhoradas para garantir a continuidade dos serviços. A série NVS incorpora um serviço de banda L1 adicional para alargar os serviços fornecidos. O NVS-01, o primeiro dos satélites de segunda geração, foi lançado a bordo do GSLV-F12 a 29 de Maio de 2023. Pela primeira vez, um relógio atómico nativo voou no NVS-01.
Com uma massa de 2.250 kg no lançamento, o NVS-02 está configurado com carga útil de navegação nas bandas L1, L5 e S, bem como carga útil de alcance na banda C, como o seu antecessor-NVS-01. O satélite é bvaseado na plataforma I-2K standard. Será colocado a 111,75ºE substituindo o IRNSS-1E. O satélite utiliza uma combinação de relógios atómicos desenvolvidos na Índia e adquiridos externamente para uma estimativa precisa do tempo.
O satélite NVS-02 foi concebido, desenvolvido e integrado no UR Satellite Centre (URSC) com o apoio de outros centros de trabalho. Após a conclusão da Montagem e Testes Integrados (Assembly and Integrated Testing, AIT), o satélite foi submetido a testes térmicos e de vácuo para verificar e validar o seu design e desempenho em ambiente espacial simulado durante o período de Novembro-Dezembro de 2024. O satélite foi submetido a testes dinâmicos durante Dezembro de 2024, confirmando assim a sua adequação para suportar as cargas dinâmicas previstas durante o lançamento.
Uma revisão abrangente de pré-embarque (Pre-shipment Review, PSR) do desempenho e conformidade do satélite durante várias fases da sua realização foi concluída a 27 de Dezembro de 2024. O satélite foi enviado para o Centro Espacial de satish Dawan a 5 de Janeiro de 2025.
De forma geral, os satélites NVS estão equipados com duas asas solares com junções UTJ (Ultra Triple Junctions) que geram cerca de 1.660 Watts de energia eléctrica, cada. As suas dimensões são 1,58 x 1,50 x 1,50 metros e o seu tempo de vida útil deverá ser de 12 anos. O referencial de orientação do satélite é proporcionado por sensores solares e estelares, bem como por giroscópios. Esquemas especiais de controlo térmico foram desenhados e implementados para alguns dos elementos críticos a bordo, tais como os relógios atómicos.
O sistema de controlo orbital e de atitude AOCS (Attitude and Orbit Control System) mantém a orientação do satélite com a ajuda de rodas de reacção, torques magnéticos e pequenos motores, enquanto o sistema de propulsão é composto por um motor de apogeu de combustível líquido LAM (Liquid Apogee Motor) e pequenos propulsores.
A bordo dos satélites encontram-se duas cargas, sendo uma de navegação e outra para determinação de distâncias. A carga de navegação transmite sinais de navegação aos seus utilizadores e opera na banda L5 (1.176,45 MHz) e banda S (2.492,028 MHz). Um relógio atómico de rubídio altamente preciso faz também parte desta carga. Por seu lado, a restante carga tem como função determinar as distâncias mediante um repetidor de banda C que facilita a determinação precisa das distâncias. O satélite também transporte os denominados Corner Cube Retro Reflectors para determinação de distância utilizando raios laser.
O sistema de navegação indiano consiste num segmento espacial e num segmento de solo. O segmento espacial é composto por sete satélites, estando três em órbita geoestacionária e quatro em órbitas geoestacionárias inclinadas. O segmento de solo será responsável pela geração dos parâmetros de navegação e a sua transmissão, controlo dos satélites, determinação de localização e monitorização da integridade e manutenção temporal.
A bordo transporta cargas operacionais nas bandas L1, L5 e S. A energia para o funcionamento do satélite é fornecida através de dois painéis solares capazes de gerar até 2,4 kW de potência e uma bateria de lítio capaz de suportar a carga e as necessidades da plataforma em alturas de eclipse orbital.
O satélite utiliza uma gestão térmica activa e passiva, um sistema de propulsão unificado de bi-propelente e um sistema de estabilização espacial nos três eixos de momento nulo com giroscópios.
Em comparação com os satélites de navegação da primeira geração, os satélites de navegação da segunda geração incluem uma banda de navegação L1 e estão equipados com relógios atómicos de rubídio. A banda de navegação L1 é popular para o fornecimento de serviços PNT (Posição, Navegação e Temporização) para os utilizadores civis e para interoperacionalidade com outros sinais GNSS. O relógio atómico a bordo, desenvolvido na Índia pelo Centro de Aplicações Espaciais de Ahmedabad, é uma tecnologia importante apenas na posse de poucas nações.
Tal como o NVS-01, o NVS-02 será utilizado para serviços de navegação terrestre, aérea e marítima; agricultura de precisão, trabalhos de geodesia; serviços de emergência; gestão de frotas; serviços de localização em dispositivos móveis; determinação dos parâmetros orbitais para satélites; pescas; serviços de temporização para instituições financeiras, redes de energia e outras agências governamentais; aplicações baseadas na IoT (Internet of Things); e aplicações estratégicas.
O GSLV MkII
O foguetão Geosynchronous Satellite Launch Vehicle (GSLV) é o veículo mais recente na frota de lançadores indiana, tendo sido projectado para colocar em órbita de transferência geossíncrona satélites de comunicações e é o quarto lançador desenvolvido pela Índia após o Satellite Launch Vehicle (SLV), Augmented Satellite Launch Vehicle (ASLV) e o Polar Satellite Launch Vehicle (PSLV).
O lançamento inaugural do GSLV a 20 de Abril de 2001 transportou o satélite de comunicações experimental GramSat-1 (GSAT-1). Nesta missão os dois primeiros estágios do veículo tiveram o desempenho desejado, porém a queima do terceiro estágio não correu como previsto, colocando a carga numa órbita mais baixa do que a desejada. A missão seguinte do GSLV em Maio de 2003 teve melhor sucesso, colocando o GSAT-2 na sua órbita de transferência prevista.
O foguetão GSLV MkII (designação geral dos foguetões GSLV que utilizam um estágio superior desenvolvido na Índia) está equipado com um novo estágio superior de fabrico indiano. No seu voo inaugural em Abril de 2010 transportou o satélite GSAT-4. Com os dois primeiros estágios a funcionarem como previsto, o terceiro estágio teve um problema a 2,2 segundos após a sua ignição, levando à perda do satélite. O problema esteve relacionado com a Fuel Boost Turbopump (FBTP) que aparentemente perdeu velocidade logo após a sua entrada em funcionamento. Após este falhanço a ISRO optou por levar a cabo mais testes no novo terceiro estágio, utilizando o GSLV MkI para as suas missões.
O GSLV é um lançador a três estágios com quatro propulsores laterais adicionando força ao primeiro estágio.
O primeiro estágio, GS1 (composto pelo estágio central S139 e pelos propulsores laterais 4L40H), utiliza um motor S-139 de propulsão sólida utilizando HTPB (hydroxyl-terminated polybutadiene). O estágio pode desenvolver até 4.846,9 kN de força máxima. Tem um comprimento de 20,176 metros e um diâmetro de 2,8 metros. Transporta 132,228 t de propelente (no lançamento a sua massa é de 160,869 t) e o seu tempo de queima é de 106 segundos.
Os quatro propulsores laterais 4L40H utilizam o motor Vikas que consome UH25 (uma mistura de três partes de UDMH – dimetil-hidrazina assimétrica – e uma parte de hidrato de hidrazina (N2O4) – que é oxidada por tetróxido de dinitrogénio. O motor Vikas foi desenvolvido a partir do motor Viking de origem francesa que fez parte da família de lançadores Ariane. Cada propulsor fornece 759,4 kN de força máxima. Cada propulsor tem um comprimento de 19,682 metros e um diâmetro de 2,1 metros. Transportam 190,930 t de propelente e o seu tempo de queima é de 148,9 segundos.
O segundo estágio (GS2 ou GL40HT) também utiliza o motor Vikas e desenvolve 846,8 kN de força máxima. Tal como os propulsores laterais, consome UH25 e N2O4. Tem um comprimento de 11,938 metros e um diâmetro de 2,8 metros. Transporta 42,196 t de propelente (a sua massa no lançamento é de 47,343 t) e o seu tempo de queima é de 150 segundos.
Finalmente, o terceiro estágio (GS3) utiliza o motor CSU15 e consome hidrogénio líquido (LH2) e oxigénio líquido (LOX) como oxidante, desenvolvendo 73,55 kN de força e tendo um tempo de queima de 720 segundos. Tem um comprimento de 9,89 metros e um diâmetro de 2,8 metros. Transporta 14.996 t de propelente criogénico e a sua massa no lançamento é de 17.579 t.
O estágio criogénico superior é um sistema de propulsão mais eficiente e fornece mais força por cada quilograma de propelente que utiliza em comparação com os estágios sólidos ou hipergólicos. Tecnicamente, o estágio criogénico é um sistema mais complexo em comparação com os estágios sólidos ou hipergólicos devido à sua utilização de propelentes a temperaturas extremamente baixas e devido aos desafios térmicos que lhes estão associados. O oxigénio liquidifica a -183ºC e o hidrogénio a -253ºC. Os propelentes a estas temperaturas baixas têm de ser bombeados por turbo-bombas que funcionam a 40.000 rpm.
Lançamento do GSLV-F15*
O lançamento inicia-se com a ignição dos quatro propulsores laterais 4L40H, 4,8 segundos antes da ignição do estágio central. O estágio central de propulsão sólida S139 entra em ignição a T=0,1s. Finalizada a sua queima, o primeiro estágio permanece ligado ao segundo estágio aguardando o final da queima dos quatro propulsores laterais cuja queima tem uma duração ligeiramente superior. A T+2m 29,0s, os propulsores terminam a sua queima. A ignição do segundo estágio GS2 ocorre a T+2m 29,6s, com a separação do primeiro estágio e dos propulsores laterais a ocorrer a T+2m 31,2s.
A separação das duas metades da carenagem de protecção ocorre a T+3m 57,4s e a T+4m 51,2s termina a queima do segundo estágio que se separa a T+4m 54,7s.
A ignição do terceiro estágio CUS ocorre a T+4m 55,7s, sendo desactivado a T+18m 55,7s e terminando a sua queima a T+19m 00,7s. A separação do satélite NVS-02 ocorre a T+19m 10,7s.
* Os tempos indicados baseia-se na informação fornecida pela ISRO.
Imagens: ISRO