1995 – Uma Bandeira no Espaço

Quando em princípios 1995, a Direcção do Agrupamento XIX – S. Vicente, Braga, do Corpo Nacional de Escutas, iniciou um Conselho de Agrupamento para discutir o balanço do ano de 1994 e programar as actividades para o ano que então se iniciava, não esperava pela surpresa que teriam no final dessas reunião. Já no período Após a Ordem do Dia, um dos Dirigentes do Agrupamento pediu a palavra para anunciar o que seria um facto histórico na vida do Agrupamento XIX, em particular, e do Corpo Nacional de Escutas, em geral.

Desde o princípio da Era Espacial, que todos os que nela participavam gostavam de possuir algo relacionado com essa conquista histórica da Humanidade. Com os voos tripulados, cada astronauta levava consigo inúmeros artigos e recordações para mais tarde distribuir pelos que lhe eram mais próximo. Desde pequenas réplicas das capsulas que tripulavam, passando por notas, moedas, selos, discos, pequenos brinquedos e inúmeros objectos, tudo servia de recordação e além do mais era algo que havia estado em órbita da Terra. Uma simples colher de sopa podia então atingir valores muito elevados só pelo simples facto de ter participado num voo espacial. Mesmo nas missões lunares foram transportados inúmeros itens, mas aos astronautas da Apollo sempre lhes foi negado uma pedra lunar para mais tarde recordar …

Com o advento dos vaivéns espaciais e com a «banalização» dos voos orbitais, cada vez era mais frequente os tripulantes dessas missões levarem objectos que depois distribuíam pelas mais diversas instituições. Os vaivéns costumavam transportar artigos (bandeiras, emblemas comemorativos, etc.) dos mais diversos países e segundo fonte da NASA, cada missão do vaivém espacial transporta uma colecção de todas as bandeiras de todas as nações do planeta …

No Agrupamento de Escuteiros de S. Vicente, existia alguém que possuía um interesse mágico pela conquista do espaço e foi sabendo da disponibilidade da NASA em transportar esses artigos, que por iniciativa própria e sem anunciar a sua intenção ao seus companheiros do Agrupamento, escreveu para a agência espacial americana propondo que uma réplica da bandeira do seu Agrupamento de Escuteiros pudesse viajar a bordo de um vaivém espacial como forma de comemorar o 60º aniversário da fundação do Agrupamento.

O primeiro contacto foi realizado em 15 de Outubro de 1993. Pouco mais de dois meses depois era recebida uma carta enviada da sede da agência espacial americana (datada de 17 de Dezembro) onde era anunciada a recepção da carta inicial e que esta havia sido reencaminhada para o Centro Espacial Lyndon B. Johnson, em Houston, Texas, onde a proposta iria ser analisada.

Nos princípios de 1994, era recebida uma segunda carta (datada de 28 de Dezembro de 1993) e desta vez proveniente do Centro Espacial Lyndon B. Johnson (assinada por Daniel A. Nebring, Director Associado), onde se fazia referencia à recepção da proposta inicial e se colocavam algumas condições que deveriam ser cumpridas para que a bandeira pudesse viajar a bordo de um vaivém espacial. Essas condições eram as seguintes: a) Os artigos a transportar no vaivém espacial não podem ser posteriormente vendidos nem tão pouco cedidos para venda; b) Os artigos a transportar no vaivém espacial não podem ser utilizados para fins pessoais, comerciais ou de campanhas de angariação de fundos; c) Os artigos a transportar no vaivém espacial deverão, em geral, ser colocados em exposição pública.

Na carta era já referida a forte possibilidade de a bandeira dos Escuteiros ser incluída numa das próximas missões do vaivém espacial.

Era essencial cumprir estes requisitos para que se assegurasse a hipótese de que a bandeira do Agrupamento XIX pudesse viajar no espaço. Obviamente que tudo seria realizado na base de que estes requisitos fossem cumpridos e foi assim que uma segunda carta foi então enviada para o Centro Espacial Lyndon B. Johnson, onde se referia o compromisso de que a bandeira seria colocada em exposição pública e serviria também para divulgar o Movimento Escutista, por um lado, e a maior aventura Humana dos nossos dias, por outro.

Os meses foram passando e a seguinte comunicação da NASA só surge em finais de 1994, em carta datada de 1 de Dezembro. No entanto a espera dava frutos, pois foi nessa carta que se deu a confirmação … a bandeira dos Agrupamento XIX – S. Vicente iria voar no espaço e solicitava-se já o seu envio. Apesar de nesta fase ainda não ser certa qual a missão que iria transportar a bandeira, era certo que o voo teria lugar entre 1995 e 1997, dependendo da aprovação final da Direcção da NASA e da disponibilidade de carga do vaivém.

A bandeira é enviada para a NASA em Fevereiro de 1995 e em Abril desse mesmo ano é recebida a confirmação da recepção da bandeira no Centro Espacial Lyndon B. Johnson. Nesta altura as comunicações eram realizadas com Abigail A. Cassel, Oficial Administrativa do Centro Espacial Lyndon B. Johnson. Porém esta carta ainda guardava uma surpresa. Os Escuteiros não teriam de esperar dois anos para ver a sua bandeira no espaço, pois acabava de ser integrada no manifesto da missão STS-69 Endeavour que na altura estava planeada para Julho de 1995.

No entanto, a missão do Endeavour acabaria por sofrer vários atrasos devido a múltiplos factores, entre os quais a análise dos propulsores de combustível sólido a serem utilizados na missão STS-71 do vaivém espacial Atlantis à estação orbital Mir e as más condições atmosféricas que por vários dias afectaram a região do Centro Espacial Kennedy devido à presença do furacão “Erin”.

Os problemas e contratempos foram sucessivamente resolvidos e finalmente às 1609:00,052UTC do dia 7 de Setembro de 1995, o vaivém espacial Endeavour iniciava a sua 9ª viagem espacial (a 183ª viagem espacial tripulada; 102 ª missão espacial dos Estados Unidos e a 71ª missão espacial de um vaivém). O lançamento dava-se desde a Plataforma A do Complexo de Lançamentos n.º 39 do Kennedy Space Center. Então o Endeavour foi comandado por David Mathienson Walker, sendo o piloto da missão era o astronauta Kenneth Dale Cockrell e os três especialistas de voo os astronautas James Shelton Voss, James Hansen Newman e Michael Landen Gernhardt.

A bordo do Endeavour seguia a primeira bandeira de uma associação escutista de Portugal a viajar no espaço e que ao mesmo tempo se tornaria na primeira bandeira do Corpo Nacional de Escutas em órbita; no primeiro objecto de Braga a viajar no espaço e num dos poucos símbolos escutistas a viajar no espaço. Sem dúvida um marco histórico para o Agrupamento XIX e para todo o Corpo Nacional de Escutas, pois tornava-se numa das raras associações escutistas a nível mundial a colocar em órbita um símbolo seu. Esta façanha serviu não só para marcar o aniversário do Agrupamento XIX, mas também para homenagear todo o C.N.E. pelo seu trabalho desenvolvido ao longo de então 70 anos em prol da juventude e não só.

Durante a missão STS-69, o Endeavour colocou em órbita dois satélites e dois dos seus tripulantes realizaram uma saída para o espaço antes de regressar à Terra no dia 18 de Setembro de 1995. A aterragem deu-se às 1237:56UTC na Pista 33 do KSC. O Endeavour acabava de percorrer 8.334.000 km.

A bandeira regressou a Braga no dia 23 de Outubro de 2002, juntamente com um certificado de autenticidade emitido pela agência espacial norte-americana e que atesta o voo efectuado a bordo do vaivém Endeavour. Actualmente a bandeira encontra-se em exposição permanente na sede do Agrupamento XIX, tendo já participado em várias exposições.

Encontra-se em exposição permanente na Sede do Agrupamento XIX – S. Vicente, Braga, do Corpo Nacional de Escutas.

Imagens: Rui C. Barbosa e NASA