Utilizando as suas estações espaciais para ir ganhando experiência de permanências cada vez mais prolongadas em órbita, os especialistas Soviéticos chegaram à conclusão de que não haveria a necessidade de se proceder à realização de missões ‘solo’ de apenas uma cápsula espacial em órbita.
Missões anteriores, tais como a Soyuz-3, Soyuz-4 e Soyuz-5, já haviam demonstrado as capacidades de permanência em órbita da Soyuz que agora assumia um papel de «táxi» ao transportar os cosmonautas Soviéticos para as estações espaciais em órbita.
Porém, e após a realização do Programa Experimental Apollo-Soyuz, a União Soviética tinha ainda uma cápsula espacial e um foguetão lançador que poderia utilizar numa última missão solitária que teria como objectivo testar equipamentos que seriam utilizados na estação espacial Salyut-6. Esta seria a missão Soyuz-22.
Os cosmonautas para a última Soyuz solitária
Em princípios de 1976 seis cosmonautas haviam sido seleccionados para iniciar os treinos para uma missão em órbita que não iria envolver a utilização de uma estação espacial. Esta missão iria utilizar o veículo Soyuz suplente do Programa Experimental Apollo-Soyuz que estaria equipada com uma câmara fabricada na República Democrática Alemã – RDA – (a MKF-6) e que seria utilizada para observar os recursos terrestres. Uma câmara semelhante faria parte do equipamento a bordo da futura estação espacial Salyut-6.
Os seis cosmonautas foram divididos em três tripulações de dois elementos constituídas por: Valeri Fyodorovich Bykovsky e Vladimir Viktorovich Aksyonov (tripulação principal), Yuri Vasiliyevich Malyshev e Gennadi Mikhailovich Strekalov (tripulação suplente), e por Leonid Ivanovich Popov e Boris Dmitriyevich Andreyev (tripulação de apoio). Alguns destes cosmonautas encontravam-se a treinar para missões a bordo das estações espaciais Salyut antes de serem de designados para a missão Soyuz-22. Por seu lado, Valeri Bykovsky havia já tido contactos com especialistas Alemães relacionados com a câmara MKF-6 e dois anos mais tarde iria mesmo comandar a missão Intercosmos de cooperação com a RDA. Após a missão Soyuz-22 estas tripulações seriam dissolvidas.
As características especiais da Soyuz-22
O veículo Soyuz 7K-TM n.º 74 era o veículo suplente da Soyuz-19 que participou no Programa Experimental Apollo-Soyuz. A missão da Soyuz-22 seria a de testar e avaliar em voo equipamentos que seriam utilizados na próxima estação espacial civil, a Salyut-6, sendo escolhida a câmara MKF-6 com uma massa de 203 kg que seria colocada na parte frontal do veículo no lugar do mecanismo de acoplagem. A câmara multiespectral MKF-6 seria utilizada num programa de observação da Terra designado ‘Raduga-1’. As observações seriam feitas através de uma escotilha especial com um diâmetro de 428 mm.
Os dados obtidos seriam registados em quatro comprimentos de onda visíveis e dois comprimentos de onda infravermelhos, obtendo-se uma resolução de 20 metros e cobrindo uma área de 800.000 km2 em dez minutos. A câmara utilizava seis cassetes de filme, sendo uma para cada banda espectral (8.400 Å – infravermelho, 7.200 Å- infravermelho, 6.600 Å – vermelho, 6.000 Å – laranja, 5.400 Å – verde, 4.800 Å – azul). fabricada pela Carl Zeiss Jena, utilizava filme de 70 mm (70 x 91 mm; 50 x 80 mm de exposição). Apesar de muito útil para a obtenção de informação sobre os recursos terrestres, a resolução não era tão boa para observações militares como a resolução obtidas nas estações militares Almaz e baseavam-se nas observações dos próprios cosmonautas para suplementar os dados obtidos. A câmara era operada por um dos cosmonautas (Vladimir Aksyonov) no interior do Módulo Orbital, enquanto que a orientação da cápsula espacial era controlada pelo outro cosmonauta (Valeri Bykovsky) a partir do Módulo de Descida.
A MKF-F só foi finalizada em Abril de 1976, tendo um protótipo sido utilizado na Soyuz-22 antes da utilização de um modelo melhorado a bordo da Salyut-6.
A missão da Soyuz-22
O lançamento da missão Soyuz-22 teve lugar às 09:48:30,026UTC do dia 15 de Setembro de 1976 e foi levado a cabo pelo foguetão 11A511U Soyuz-U (E15000-069) a partir da Plataforma de Lançamento PU-1 do Complexo de Lançamento LC1 do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur. Após se separar do último estágio Blok-I do lançador, a Soyuz-2 ficou colocada numa órbita com um perigeu a 185 km de altitude, apogeu a 296 km de altitude e inclinação orbital de 64,75.º
A cápsula tinha uma massa de cerca de 6.500 kg no lançamento, sendo 250 kg o Módulo da Câmara, 900 kg o Módulo Orbital, 2.750 kg o Módulo de Descida e 2.600 kg o Módulo de Instrumentação.
Apesar de ter uma natureza civil, o facto de a Soyuz-22 ter sido colocada numa órbita com uma inclinação de 64,75.º revelou também a sua natureza parcialmente militar. Esta inclinação orbital não era utilizada por um veículo tripulado Soviético desde o Programa Voskhod e permitiu a observação dos exercícios militares da NATO denominados ‘Teamwork’ a decorrer na Noruega na altura. A elevada inclinação orbital da Soyuz-22 também maximizava as potenciais observações do território da RDA. Aliás, havendo uma colaboração daquele país na missão, o lançamento da Soyuz-22 foi testemunhado por uma delegação Alemã e a agência de notícias Soviética TASS acabaria por referir que cosmonautas dos países do Bloco de Leste iriam em breve participar em missões espaciais à futura estação espacial.
Após o lançamento, a Soyuz-22 iria levar a cabo duas manobras orbitais para ajustar a sua órbita. A primeira teria lugar na quarta órbita com o veículo a ficar colocado numa órbita com um perigeu a 250 km de altitude e um apogeu a 280 km de altitude. A segunda manobra ocorreria na 16.ª órbitra com a Soyuz-22 a ser colocada numa órbita com um perigeu a 251 km de altitude e apogeu a 257 km de altitude.
As fotografias iniciais foram obtidas sobre o território da União Soviética e da RDA, com as imagens de teste a focarem-se na linha de caminho de ferro Baikal-Amur. Os testes da câmara foram finalizados na 15.ª órbita com a observação do horizonte terrestre, da Lua e de áreas sobre o continente asiático. Outras observações cobriram a Sibéria, o Mar de Okhotsk e o Noroeste da União Soviética.
A MKF-6 foi também utilizada para levar a cabo análises da atmosfera terrestre ao observar o nascer e o ocaso da Lua, e realizar estudos geológicos na Ásia Central, Cazaquistão e Sibéria. Muitas destas imagens foram comparadas com outras fotografias que eram obtidas na mesma altura a partir de um avião Antonov An-30 equipado com câmaras MKF-6 que sobrevoava as mesmas regiões.
No final da missão foram obtidas 2.400 fotografias que foram armazenadas no Módulo de Descida para serem trazidas para a Terra. Estas fotografias cobriram 20 milhões de quilómetros quadrados dos quais metade seriam do território Soviético. A tripulação também procedeu à desmontagem da câmara para remover os seus filtros coloridos que eram necessários para calibrar as imagens na Terra.
Para além da obtenção da fotografias da superfície terrestre com a câmara MKF-6, Bykovsky e Aksyonov levaram a cabo várias experiências biológicas com o sistema Biogravistat que utilizou uma centrifugadora localizada no Módulo Orbital para estudar o crescimento das plantas em gravidade artificial. Os dois homens também estudaram os efeitos dos raios cósmicos no sistema visual humano.
A missão da Soyuz-22 terminaria a 23 de Setembro de 1976 com uma aterragem às 0740:47UTC após um voo de 7 dias 21 horas 52 minutos e 17 segundos. A aterragem deu-se a 150 km a Noroeste de Tselinogrado (posteriormente Astana e actual Nur-Sultan), Cazaquistão.
Bibliografia:
- “Soyuz – A universal spacecraft”, Rex D. Hall e David J. Shayler (Springer Praxis, 2003)
- Spacefacts, http://www.spacefacts.de
- Imagem destacada cedida por Spacefacts, http://www.spacefacts.de