Astronáutica

Perguntas & Respostas – Por José Matos

Quem é José Matos?

José Matos é divulgador e formador na área da astronomia e das ciências do espaço. Tem vários cursos de formação nesta área, obtidos na Universidade Central de Lancashire, em Preston, Reino Unido, onde tem estudado nos últimos anos. Dedica-se à divulgação da astronomia desde 1994, fazendo visitas frequentes a escolas e também realizando vários cursos livres na área da astronomia, da exploração planetária e da exploração espacial. É comentador do Jornal da Tarde da RTP 1 e da Rádio Renascença em questões de astronomia e exploração espacial. É também revisor científico de obras sobre astronomia.

01. O que significa estar em órbita?

Estar em órbita significa estar em queda livre à volta da Terra. Se tivermos um canhão super potente e lançarmos um obus a uma velocidade de 7,9 km/s (28440 km/h), o projéctil circulará continuamente rasando o solo sem nunca cair na superfície terrestre. É a chamada velocidade de "satelitização" e que varia em função da gravidade do planeta (g) e a da distância ao centro da Terra (R) segundo a seguinte equação:

Podemos, por isso, dizer que um satélite é um obus lançado com tanta velocidade que cai sempre paralelamente à curvatura da Terra, ou seja, anda tão depressa que cai para além do horizonte. De facto, um satélite em órbita está constantemente a cair à volta da Terra puxado pela gravidade. Aliás, se não houvesse gravidade seguiria uma linha recta e desapareceria. Mas na realidade cai e durante cada segundo cai 5 m como qualquer corpo.

Ora acontece que a curvutura da Terra é de 5 m por 8 km. Portanto, a cada segundo o satélite cai 5 m em direcção ao solo, mas também está 8 km mais à frente. Por isso, consegue sempre cair para além do horizonte. No entanto, esta velocidade orbital varia em função da altitude como se pode ver na tabela seguinte.

Altitude em km Velocidade em km/s Período em minutos
200 7,793 88,2
400 7,677 92,3
600 7,566 96,4
000 7,460 100,6
1.000 7,358 104,8
35.9000 3,070 1436,1
02. Porque flutua um astronauta em órbita?

O astronauta flutua porque está em queda livre. Ele e todos os objectos dentro da nave. E esta situação nada tem a ver com falta de gravidade, pois em órbita da Terra há gravidade. Também se chama a este estado imponderabilidade ou microgravidade.

03. O que é a velocidade de libertação ou de escape?

É a velocidade que um objecto tem que atingir para se libertar da gravidade da Terra. No caso da Terra são 11,2 km/s. É dada pela equação:

No entanto, trata-se da velocidade junto ao solo, pois varia com a altitude. Deste modo, uma nave em órbita terrestre, não precisa atingir aos 11,2 km/s para escapar à gravidade do planeta, mas menos um pouco.

04. O que é uma órbita geoestacionária?

É uma órbita em que um satélite está sempre situado sobre o mesmo ponto da Terra e dá uma volta ao planeta em 24 horas, ou seja, acompanha o movimento de rotação da Terra. Isto só é possível a 35.786 km de altitude, quando a velocidade angular de um satélite se torna igual à velocidade angular de rotação da Terra, ou seja, 15 graus por hora. Um satélite a esta altitude está sempre situado sobre o mesmo ponto do globo terrestre, caso a sua órbita não tenha qualquer inclinação.

Se tiver inclinação passa a ser somente uma órbita geosincrónica, ou seja, acompanha a rotação da Terra, mas não consegue estar sempre sobre o mesmo ponto. Os satélites geoestacioários estão todos situados sobre o equador e sua órbita tem sempre uma inclinação de 0 grau. Nesta posição, o satélite cobre constantemente 42% da superfície terrestre.

05. Um satélite nunca cai?

São conhecidos vários casos de naves ou de satélites que entraram na atmosfera terrestre. Isto significa que a permanência em órbita de um satélite não é eterna. Existem vários factores que contribuem para a queda e que variam em função da altitude. Satélites em órbitas baixas (entre 200 e 800 km) são travados lentamente pelas camadas mais exteriores da atmosfera, que apesar de serem muito rarefeitas exercem, mesmo assim, alguma resistência ao movimento do satélite.

A 600 km de altura, por exemplo, a perda de altitude é da ordem de 1 metro por órbita, mas a 400 km é já de dezenas de metros. A Estação Espacial é o exemplo de um objecto que sofre com esta perda de altitude. Daí que a sua órbita seja regularmente corrigida de forma a compensar a perda de altitude. Para órbitas mais elevadas existem outros mecanismos para a perda de altitude como pequenas interacções com o campo magnético da Terra ou numa escala muito reduzida a pressão da radiação solar. Mas aqui os efeitos são muito reduzidos e calcula-se que um satélite a 30 mil quilômetros de altitude demore 1 milhão de anos a cair.

06. Como se desloca um foguete ou uma nave no vácuo?

Sabemos que para mover um veículo é preciso exercer sobre ele uma força e que esta força deve ter um ponto de apoio, sobre o qual exerce uma força igual e oposta à primeira. É a lei da acção-reacção de Newton. Mas se um veículo se desloca no vácuo não tem qualquer ponto de apoio. Aqui entra em jogo a conservação do momento linear (ou quantidade de movimento), que determina que o momento linear de um sistema é constante enquanto não houver forças exteriores a actuar sobre o sistema, ou a resultante das ditas for nula.

O momento linear é uma grandeza vectorial: portanto tem módulo, direcção e sentido, isto é, orientação espacial. Quando disparamos um canhão, antes do disparo, o canhão está paradoà nossa frente, logo, o momento linear do conjunto (soma vectorial dos momentos lineares do canhão e do projéctil, que ainda está parado lá dentro) é uma soma nula. Quando disparamos o projéctil terá, à saida do cano, um dado momento linear (m × v). Para que a soma dos momentos lineares continue nula o momento linear do canhão, sozinho, terá de ser um vector simétrico do momento linear do projéctil.

Como o canhão pesa muito mais que o projéctil, o canhão recua, mas com menor velocidade que o projéctil. Isto aconteceria mesmo no vácuo. Ora um foguetão lança matéria para trás, continuamente, à taxa de uns tantos kg/s. Isto é o mesmo que estar constantemente a lançar pequenos projécteis, em torrente. Do mesmo modo, um indivíduo num barco pequeno, a remos, que lança uma pedra de 5 kg para trás verá que o barco avança. É este princípio da autopropulsão no espaço.

07. O que é um propergol?

Quando temos um combustível e um comburente a sua mistura é designada por propergol. Na propulsão propergólica um combustível como o hidrogênio líquido ou a hidrazina é queimado na presença de um comburente que pode ser o oxigênio líquido. Esta reacção é do tipo químico e está na base de todos os foguetões actuais.

Embora os propergóis químicos não tenham grandes velocidades de ejecção (de 3 a 4 km/s), conseguem, mesmo assim, colocar objectos em órbita, pois o peso da sua maquinaria é muito leve e o impulso desenvolvido consegue assim ultrapassar o peso terrestre do conjunto. Basta dizer que as paredes de um foguetão Centauro têm apenas 0,4 mm de espessura, o que dá uma relação peso/potência muito boa.

08. O que é a propulsão não propergólica?

Enquanto que na propulsão propergólica temos combustível e comburente na não propergólica, temos somente um fluido propulsivo que é aquecido a temperaturas elevadas sendo depois ejectado a grande velocidade. Existem vários tipos de propulsão não propergólica, mas uma das mais faladas tem sido a nuclear. Neste tipo de propulsão, um fluido propulsivo como o hidrogénio é aquecido por um reactor nuclear a temperaturas elevadas sendo depois ejectado a grande velocidade. Este tipo de propulsão apresenta melhor rendimento do que a combustão H2 + O2, pois esta última produz vapor de água, mais pesado que H2.

Desta forma, para uma missão tripulada a um planeta distante como o Marte, um sistema de propulsão nuclear é mais vantajoso em termos de impulso do que a tradicional propulsão química, pois consegue maiores velocidades de ejecção do que um sistema químico. Num sistema nuclear o hidrogénio pode atingir velocidades de ejecção de 10 km/s.

Embora vários sistemas de propulsão nuclear tenham sido experimentados nos Estados Unidos e na antiga União Soviética, a investigação a este nível ainda não conseguiu produzir máquinas suficientemente leves e potentes para terem uma aplicação prática. No entanto, o orçamento da NASA para 2004 tem uma verba de 93 milhões de dólares para o chamado projecto Prometeu, que visa desenvolver sistemas de propulsão nuclear para futuras missões de exploração planetária. No entanto, tal possibilidade é polémica, pois o uso de energia nuclear no espaço suscita sempre grandes resistências.

Para já, a NASA estar a pensar numa missão a Júpiter chamada Jupiter Icy Moon Orbiter, que visitará três das grandes luas de Júpiter (Io, Europa e Ganimedes), na próxima década. Esta sonda irá usar um reactor de fissão nuclear para alimentar um sistema de propulsão iónica. Portanto, não se trata de uma missão de propulsão nuclear, mas o uso de um gerador nuclear maior do que o habitual poderá trazer grande polémica à missão.

09. O que é a propulsão iónica?

A propulsão de iónica é uma tecnologia que envolve a ionização de um gás para impulsionar uma nave. Em vez de a nave usar uma reacção do tipo químico na sua propulsão, usa xenón ionizado. Um gás ionizado é um gás electricamente carregado, ou seja, que ganhou ou perdeu electrões. A ionização é feita por uma corrente eléctrica, que é produzida a partir da conversão de energia solar em energia eléctrica. Isto para sondas que não estejam muito longe do Sol, pois se for uma missão para além de Marte será preciso uma outra fonte eléctrica como um gerador nuclear.

Este gás de iões (ou íons) é depois acelerado eletricamente a uma velocidade de cerca de 30 km/s, fornecendo impulso para a nave. Este impulso pode ser dez vezes mais rápido do que num sistema de propulsão química. No entanto, embora altamente eficiente, a propulsão iónica é muito suave em termos de impulso e, por isso, não pode ser usada quando uma aceleração rápida é requerida. Com paciência, um sistema de propulsão iónica pode fazer com que uma sonda chegue actualmente aos 4,5 km/s.

Mas como esta velocidade depende da quantidade de combustível (gás) disponível é perfeitamente possível que no futuro naves com mais combustível cheguem a velocidades ainda maiores. Para já, as únicas sondas que usaram propulsão iónica foram a Deep Space 1 da NASA, a Smart-1 da ESA e a MUSES-C do Japão. A ESA está a testar esta tecnologia, porque pretende aplicá-la em futuras missões ao planeta Mercúrio, com a sonda Bepi-Colombo, prevista para 2009, e ao Sol, com a Solar Orbiter, em 2012. Quanto à NASA vai aplicá-la novamente na Jupiter Icy Moon Orbiter a Júpiter e na missão Dawn aos asteroides.

10. Onde apareceram os primeiros foguetes?

Os primeiros foguetes apareceram na China no século XIII e eram usados como armas. Eram foguetes accionados por pólvora. Só em 1926 é que surgiu o primeiro precursor dos foguetões modernos, um foguetão que usava combustível líquido (oxigênio líquido e gasolina) Este foguetão foi lançado por um professor de física norte-americano, Robert Goddard, que o lançou a 16 de Março, numa quinta no Massachusetts. Ele atingiu uma altura de 14 metros e caiu a 62 metros do local de lançamento.

Apesar do voo curto, a experiência encorajou Goddard e outros construtores de foguetões a continuarem com o seu trabalho e a produzirem foguetões cada vez melhores. Mas seria durante a 2ª Guerra Mundial, na Alemanha, que a tecnologia de foguetes daria um grande salto com o desenvolvimento da V-2. Depois da guerra, a aposta no desenvolvimento de mísseis de longo alcance estaria no origem dos primeiros foguetões capazes de pôr cargas em órbita.

11. Qual é o foguetão mais potente do mundo?

O mais poderoso foguetão construído até hoje foi o soviético Energia. Este foguetão foi apenas usado duas vezes em 1987 e 88. No entanto, apesar de ter um impulso ligeiramente superior ao Saturno V norte-americano, a verdade é que este último tinha maior capacidade de colocação de carga em órbita.

Isto deve-se ao facto do Saturno V ser lançado de uma latitude mais favorável e também à constituição de cada foguetão e à massa que cada um tem que arrastar até uma determinada altitude. No entanto, nem um nem outro estão actualmente ao serviço, pois já não há missões que justifiquem foguetões tão potentes.

12. Quem foi o primeiro homem no espaço?

Foi Yuri Gagarin que fez o seu vôo na Vostok 1 em 12 de Abril de 1961. Gagarin deu apenas uma volta à Terra em 108 minutos numa órbita que oscilou entre os 175 e os 302 quilómetros de altitude.

Depois de reentrar na atmosfera, Gagarin ejectou-se da cápsula a 7.000 metros de altura e aterrou na região de Saratov, na Rússia, num campo recém lavrado. Foi visto por uma camponesa e sua neta de 6 anos para quem gritou: "Sou um amigo, sou soviético!". Foi ela que lhe indicou um telefone para ele dar para Moscovo a notícia da sua aterragem bem sucedida. Depois deste primeiro voo espacial nunca mais voltaria ao espaço. Morreu em Março de 1968 quando fazia um vôo num avião de treino a jacto, que se despenhou com ele a bordo.

13. Quem foi o primeiro norte-americano no espaço?

O primeiro norte-americano no espaço foi Alan Shepard que em 5 de Maio de 1961, fez um voo suborbital durante 15 minutos a bordo da cápsula Mercúrio 3, que o levou até 184 km de altura. O voo de Shepard foi seguido pelo de Gus Grissom na cápsula Mercúrio 4, em Julho desse ano.

Mas tanto num caso como noutro nenhum deu uma volta completa à Terra, ou seja, nenhum entrou verdadeiramente em órbita, como tinha acontecido com Gagarin. Seria já John Glenn na cápsula Mercúrio 6 a conseguir tal feito e a dar 3 voltas à Terra. O voo de Glenn decorreu em Fevereiro de 1962, 7 meses depois do 2º voo soviético com Gherman Titov que deu 17 voltas à Terra, a bordo da Vostok 2.

14. E a primeira mulher?

Foi Valentina Tereshkova, que fez o seu voo de estreia em 16 de Junho de 1963 a bordo da cápsula Vostok 6. Valentina esteve 3 dias no espaço e deu 48 voltas à Terra. Depois desta missão, não voltou a voar, tal como nenhuma outra mulher até 1982, quando uma 2ª cosmonauta soviética esteve no espaço.

15. Quem foi o primeiro homem a andar no espaço?

Foi cosmonauta soviético Alexei Leonov. A 18 de Março de 1965, saiu da nave Voskhod 2 e flutuou até ao fim do cabo de 5 metros que o prendia à nave. Leonov rolou no espaço durante 12 minutos, mas quando tentou entrar de novo na cápsula verificou que o fato se tinha expandido e que não cabia na escotilha. Teve de reduzir em 1/4 a pressão do ar para poder entrar. Esgotado pelo esforço e pela tensão da experiência não aguentou e perdeu os sentidos quando já estava dentro da nave.

16. Quem foram os primeiros homens na Lua?

Neil Armstrong e Edwin Aldrin, foram os primeiros homens na Lua. Chegaram à Lua no dia 20 de Julho de 1969 a bordo do módulo lunar Eagle. Depois da Apollo 11 foram feitas mais 5 missões tripuladas à Lua bem sucedidas. A última foi a Apollo 17 em Dezembro de 1972. Desde então o homem nunca mais voltou à Lua e nem se sabe quando voltará.

17. Quantos homens estiveram na Lua?

Entre 1969 e 1972, a Lua foi visitada por 6 missões Apollo, o que dá um total de 12 homens que caminharam na superfície lunar.



6 comentários em “Astronáutica”

  1. Quando encontrei este site, fiquei maravilhado! Não resisti e li todos os tópicos e comentários. Acompanho a evolução da corrida espacial desde 1965 e algumas dúvidas ainda pairam sobre minha cabeça. As explicações aqui contidas ajudam a aprimorar nossos conhecimentos do assunto em questão. Parabéns aos criadores e redatores. Um forte abraço à todos!

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  2. Parabéns, uma exelente fonte de informação detalhada e de qualidade. Numa era onde ir ao espaço passou a ser “banal” e onde a ignorância e desinteresse pela ciência prolifram aqui está uma página a recomendar. Bem hajam

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  3. Como o saber realmente não ocupa espaço!!estou muito feliz por adquirir essas informações que, certamente, serão úteis no dia a dia, como aconteceu com meu vizinho quando lhe expliquei que no espaço não há falta de gravidade e, sim microgravidade ou imponderabilidade. Agradeço a todos vcs por esse conhecimento.

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