Rússia orbita novo satélite militar de observação óptica

As Forças Militares Russas colocaram em órbita um novo satélite que deverá ser o primeiro veículo de uma nova série de satélites de reconhecimento óptico.

O lançamento teve lugar às 2058UTC do dia 25 de Novembro de 2023 e foi realizado por um foguetão 14A14-1B Soyuz-2.1b a partir da Plataforma de Lançamento PU-4 do Complexo de Lançamento LC43 do Cosmódromo GIK-1 Plesetsk, Arkhangelsk.

O satélite foi catalogado numa órbita com um perigeu a 301 km, apogeu a 322 km, inclinação orbital de 96,63.º e período orbital de 90,75 minutos.

Inicialmente, foi sugerido que o satélite colocado em órbita nesta missão poderia ser o primeiro veículo 14F156 Razdan. Porém, observações posteriores do seu comportamento em órbita, levam os especialistas a descartar esse hipótese, não se adiantando qual a missão do satélite. O satélite recebeu a designação militar Cosmos 2572.

Os satélites Razdan

A próxima geração de satélites de reconhecimento electro-óptico da Rússia, os satélites Razdan, são desenvolvidos no Centro Espacial e de Foguetões Progress (RKTs Progress), Samara. Equipados com um telescópio com um espelho principal com um diâmetro de 2,35 m, deve pelo menos ser capaz de igualar as capacidades dos satélites de reconhecimento KH-11 Kennan norte-americanos que foram introduzidos em 1976.

‘Razdan’ é o nome de um rio na Arménia que flui através da capital deste país, Yerevan. ‘Razdan’ é a forma russa de referir este nome, que também é transliterado do Arménio como ‘Hrazdan’. Assim, continua-se a tradição de baptizar os satélites de reconhecimento digital com nomes designações provenientes de antigas repúblicas soviéticas e que foi iniciada com ‘Neman’ (uma série de satélites da RKTs Progress lançados entre 1991 e 2000) e ‘Araks’ (dois satélites da NPO Lavochkin lançados em 1997 e 2002). O rio Neman atravessa a Bielorrússia e a Lituânia, e o rio Araks (também conhecido como Aras) atravessa a Turquia, Arménia, Azerbaijão e o Irão.

O projecto Razdan foi revelado na imprensa russa pelo jornal “Kommersant” em Julho de 2016 (1).

Referindo “duas fontes industriais informadas” bem como tendo por base documentação legal publicamente disponível, o jornal referia que o Razdan (também designado com o seu índice militar 14F156) deveria substituir os satélites de reconhecimento electro-óptico Persona, dos quais três veículos foram lançados em 2008m 2013 e 2015 (o primeiro satélite sofreu uma falha pouco depois do seu lançamento). Os planos preliminares previam o lançamento dos primeiros três satélites Razdan em 2019, 2022 e 2014. O terceiro satélite deveria ser o primeiro a transportar uma nova carga óptica desenvolvida pela Fábrica de Mecânica Krasnogorsk S.A. Zverv (KMZ) e estar equipado com um espelho com um diâmetro de mais de 2 metros. O jornal sublinhava que os satélites Persona transportam um sistema óptico desenvolvido por outra empresa (LOMO, baseada em S. Petersburgo), mas o artigo não referia nada acerca da carga óptica dos primeiros dois satélites Razdan.

Não surgiram mais detalhes acerca do projecto na imprensa russa após a publicação do artigo do Kommersant. Porém, alguma informação acerca do projecto pode ser extraída de documentos legais disponíveis publicamente no sítio zakupki.gov.ru, de alguns documentos da RKTs Progress disponíveis na Internet, bem como de uma mão cheia de outras fontes.

Os documentos mostram que o projecto foi oficialmente iniciado a 19 de Junho de 2014 com a assinatura de um contrato (1420187209502010128000192/14-4-51/539/ZK) entre a RKTs Progress e o Ministério da Defesa. Outro contrato para o projecto foi assinado por ambas entidades a 26 de Setembro de 2016 (1622187308551452246000192). Isto é pouco usual e pode ser indicativo de problemas nas fases iniciais do projecto que obrigaram a alterações nos planos originais. O mesmo padrão foi visto no projecto de desenvolvimento dos satélites Araks-R pela NPO Lavochkin (com o contrato original a ser assinado em 2012 e subsequentemente renovado em 2016 após o projecto ter encontrado alguns problemas). Outra possibilidade é a de que o contrato original  apenas estava destinado a projectos preliminares do satélite e que o segundo contrato foi para o desenvolvimento da versão definitiva do satélite. Isto explicaria o facto de que logo após a assinatura do contrato em 2014, o desenho de alguns subsistemas foi atribuído a mais do que um subcontratante, aparentemente numa base competitiva.

Enquanto que os satélites individuais são referidos com o índice militar 14F146, o índice geral do projecto (isto é, o “sistema espacial” na terminologia russa) é 14K046. Ainda não são conhecidos os designadores para o “complexo espacial” Razdan (a combinação dos satélites e da infraestrutura no solo) e do “complexo espacial e do lançador” Razdan (a combinação do veículo lançador e da infraestrutura do cosmódromo). Como pode ser inferido a partir de dois documentos da RKTs Progress, o projecto do satélite é realizado no departamento 1032 da RKTs Progress com a liderança do Desenhador Chefe Oleg G. Fedorenko.

A carga óptica dos satélites Razdan

A carga óptica do Razdan (o denominado “complexo electro-óptico” ou OEK) é denominado Sevan, tal como o lago arménio a partir do qual o rio Razdan origina. Tal como foi referido, o artigo publicado em 2016 pelo jornal Kommersant sugeria que iriam existir duas cargas ópticas distintas para os satélites Razdan: uma não identificada para os dois primeiros satélites e uma outra (um telescópio com mais de dois metros de diâmetro construído pela KMZ) para o terceiro e subsequentes satélites. Os documentos legais de facto mostram que a RKTs Progress assinou contratos para o projecto preliminar do Sevan a 1 de Julho de 2014 com dois fabricantes de telescópios, a KMZ e a LOMO. Este trabalho deveria ser terminado no final daquele ano (2, 3)

Porém, não existe qualquer registo da LOMO em documentação posterior, levantando a questão sobre se a informação fornecida pelo Kommersant estaria correcta. De qualquer das formas, seria muito pouco provável que o mesmo tipo de satélite alterasse a sua carga óptica após apenas duas missões, o que provavelmente também iria requerer alterações no desenho do satélite

É sabido que em 2016 a LOMO havia sido seleccionada para desenvolver a carga óptica de alta resolução para os satélites civis de detecção remota Resurs-PM da RKTs Progress, que gradualmente irão substituir os actuais satélites Resurs-P nos anos 2020. A carga óptica de alta resolução dos satélites Resurs-PM foi identificada em algumas publicações como ‘Elegia’ e está equipada com um telescópio com um espelho de 1,5 metros (apesar de publicações posteriores referiram um diâmetro de 1,2 metros). É quase certo que este espelho está a ser desenvolvido para a LOMO pela Fábrica de Vidros Ópticos Lytkarino (LZOS). A revista empresarial da LZOS, “Spektr”, mencionou num artigo a entrega de dois espelhos de 1,540 mm à LOMO, presumivelmente os espelhos dos dois primeiros satélites Resurs-PM (4 pág. 4). O espelho é visto na imagem disponível aqui.

A LZOS também construiu os espelhos de 1,5 metros para os satélites Araks e Persona. Existem evidências de que os espelhos de 1,5 metros nos três satélites Persona (parte de um complexo óptico designado ’17V321′) foram fabricados pela LZOS no século passado para um satélite de reconhecimento da RKTs Progress denominado ‘Sapfir’, que nunca foi lançado. O facto de que os satélites Resurs-PM e Persona têm espelhos primários do mesmo tamanho, é um forte indicativo de que os satélites Resurs-PM são essencialmente uma derivação civil dos satélites Persona com a adição de uma carga de resolução média (imagem ao lado). Os telescópios têm diferentes montagens ópticas. Enquanto que os satélites Persona possuem um telescópio Korsch de triplo-espelho, os satélites Resurs-PM usam um telescópio de duplo espelho Ritchey-Chrétien.

O único fabricante de telescópios referido em documentos sobre o Sevan após 2014, é a KMZ. No entanto, o envolvimento da LOMO no projecto Razdan não pode ser excluído e um cenário mais plausível é o de que a LOMO e a KMZ terão sido ambas convidadas a propor cargas ópticas para o Razdan em 2014 e que a KMZ foi seleccionada como o único fabricante. Ao contrário da LOMO; a KMZ é parte da forte holding Shvabe, que une várias dezenas de organizações que formam o núcleo da industria óptica da Rússia. Isso pode ter ajudado a garantir o prestigioso contrato para o Sevan, enquanto a LOMO teve de se contentar com o contrato para os satélites Resurs-PM, o que pode parecer uma repetição do trabalho que foi feito anteriormente para os satélites Persona.

De facto, a KMZ começou a desenvolver a tecnologia para a carga óptica do Razdan ainda antes do início oficial do projecto. No final de 2013 ganhou um concurso organizado pela Roscosmos com a designação ‘Zerkalo-KT’ (“zerkalo” significa “espelho” e “KT” são as iniciais de “telescópio espacial” em Russo). O propósito deste concurso foi descrito como “o desenvolvimento de tecnologia para o fabrico de espelhos primários leve destinados a telescópios espaciais de grande tamanho e de alta resolução para detecção remota da Terra”. As especificações técnicas podem ser encontradas aqui.

O objectivo era o de construir um espelho com um diâmetro “de até 2,5 metros” (apesar de 2,3 metros ser o tamanho específico dado em alguma parte da documentação) bem como uma estrutura compósita para albergar o espelho. A massa do espelho não deveria “ultrapassar os 550 kg” e a massa de toda a estrutura “não deveria ser superior a 780 kg”. O sistema deveria ter um “tempo de serviço” de pelo menos 10 anos, sendo 3 anos de armazenamento no solo e 7 anos de utilização em órbita.

À KMZ foi atribuído o contrato (140-K709/13/396) a 9 de Dezembro de 2013. Porém, de forma estranha, o outro concorrente era a RKTs Progress, que não tem qualquer trabalho feito em tecnologia óptica. A documentação mostra que o projecto Zerkalo-KT foi prematuramente finalizado em Fevereiro de 2015, mas é óbvio a partir de outras fontes que a KMZ continuou a trabalhar no sistema nos anos posteriores. Uma possível explicação está no facto de que o Zerkalo-KT ter sido iniciado como um projecto civil financiado pela Roscosmos, mas que a agência espacial terá interrompido o financiamento em princípios de 2015 quando o espelho foi incorporado no projecto Razdan do Ministério da Defesa.

Um artigo da KMZ publicado em finais de 2014 descreve de forma breve o trabalho realizado no espelho Zerkalo-KT, referindo o seu diâmetro como 2,5 metros. Um desenho (imagem ao lado) publicado no artigo mostra um modelo computadorizado do espelho (5 pág. 38-40).

Parece que a KMZ teve luz verde para o desenvolvimento do Sevan quatro dias após a RKTs Progress ter renovado o seu contrato Razdan com o Ministério da Defesa a 26 de Setembro de 2016. Documentos legais publicados em 2018 para os temas denominados ‘Sevan-NTS’, ‘Sevan-DKO’ e ‘Sevan-DKI’, contêm um número de contrato (1619187310651452246001869) que através de outros documentos pode ser assinalado a um contrato assinado directamente entre a KMZ e o Ministério da Defesa a 30 de Setembro de 2016. De novo, isto é pouco usual porque como um fornecedor de carga, a KMZ deveria agir como subcontratante da RKTs Progress. O facto de os russos se terem desviado dos procedimentos usuais pode apontar para a especial importância atribuída pelo Ministério da Defesa a esta carga. Aparentemente, quer colocar o desenvolvimento do Sevan sobre a sua supervisão directa.

Um parceiro chave da KMZ no desenvolvimento do Sevan é a Fábrica de Vidros Ópticos Lytkarino (LZOS), responsável pela construção dos espelhos. A KMZ fez uma parceria com a LZOS para o projecto do Zerkalo-KT em 2014, possivelmente ainda antes da aprovação do Razdan. Os relatórios anuais da LZOS para 2014 e 2015 mencionam um tema denominado ‘Zerkalo-KT GZ’ (no qual as iniciais ‘GT’ significam “espelho primário”), com o relatório de 2015 a referir um diâmetro de 2,4 metros para o espelho. Os relatórios podem ser obtidos aqui.

Pelo menos duas publicações reconhecem o envolvimento da LZOS no projecto Razdan/Sevan: a edição de Abril-Maio de 2018 da revista corporativa “Spektr” da LZOS (6 pág. 29) e os procedimentos de uma conferência organizada pela LZOS em Outubro de 2019 (7 pág. 14). Outro número da Spektr (Setembro-Outubro de 2018) fornece mais alguns detalhes do projecto do Sevan, sem mencionar o projecto como tal (8 pág. 4)

Uma actualização às actividades do Departamento 95 da LZOS referiu que estava a decorrer o trabalho de fabrico de “um conjunto de especial propósito consistindo de um espelho primário de 2,4 metros, um espelho asférico secundário de 540 mm, um espelho asférico terciário desalinhado e do equipamento auxiliar de colimatação”. Referia que os complexos espelhos asféricos leves requeriam longos tempos de produção. “Especial propósito” é um termo usualmente utilizado em Russo como sinónimo de “militar” e não deve haver muitas dúvidas de que esta é uma referência ao Sevan, que assim parece utilizar uma configuração de três espelhos.

As edições de Junho-Agosto de 2018 e de Setembro de 2019 da “Spektr” mencionam os contentores necessários para transportar espelhos, incluindo um para um espelho com um diâmetro de 2.350 mm. Este deve ser o diâmetro exacto do espelho primário (com o número de 2,4 metros a ser um valor arredondado) – 9 pág. 4, e 10 pág. 5. Os documentos legais para o transporte de três espelhos surgiram em finais de 2018 e princípios de 2019 (11, 12 e 13)

Embora a documentação não refira o projecto Razdan ou Sevan, contém o número do contrato assinado entre o Ministério da Defesa e a KMZ para o Sevan a 30 de Setembro de 2016. Os contratos para o transporte do espelho secundário e terciário foram assinados a 13 de Novembro de 2018 e para o espelho primário a 20 de Março de 2019. A documentação inclui desenhos dos espelhos dentro de seus recipientes (ver imagens a seguir). Estes confirmam que o diâmetro do espelho primário é de 2,350 metros. O diâmetro do espelho secundário parece corresponder ao valor publicado de 0,54 metros e o diâmetro do espelho terciário pode ser estimado em cerca de 0,40 metros.

 

 

 

 

 

 

 

A documentação também tem as dimensões dos contentores e o que parece ser a massa combinada dos espelhos e dos contentores:

  • espelho primário: (comprimento/largura/altura) 3500х3500х930 mm / 4400 kg
  • espelho secundário: 1200×1100×615 mm / 450 kg
  • espelho terciário: 1500×1220×570 mm / 600 kg

O material utilizado para a construção do espelho primário (e, presumivelmente, dos outros dois) é denominado ‘SO-115M’, também conhecido como ‘Sitall’ ou ‘Astrositall’. Este é um material cerâmico cristalino desenvolvido pela LZOS ainda no tempo da União Soviética e tem sido utilizado principalmente nos espelhos espaciais russos, incluindo os espelhos de 1,5 metros utilizados nos satélites Araks e Persona. As publicações da LZPS reconhecem que os materiais tais como o carbeto de silício (utilizado nos observatórios Herschell e Gaia da ESA) e o berílio (utilizado no telescópio espacial James Webb) são superiores em desempenho, mas apontam para o relativo baixo custo do Sitall e o seu ultra baixo coeficiente de expansão térmica. Actualmente, o trabalho nos espelhos de carbeto de silício na Rússia encontra-se apenas numa fase experimental.

Presumivelmente, o telescópio utilizado a bordo dos satélites Razdan é um conjunto Korsch anastigmático de três espelhos, mais especificamente uma configuração Korsch Tipo 2 com um terceiro espelho fora de eixo. Mais sobre estes telescópios aqui.

A carga 17V321 dos satélites persona também utiliza uma montagem óptica Korsch. Um artigo escrito por um especialista da KMZ em 2021 inclui um diagrama de uma montagem óptica que pode muito bem ser a do Sevan, apesar de não mostrar o espelho terciário. Uma das fontes indicadas nas referências do artigo é o desenho preliminar do Sevan (12 pág. 75).

É interessante notar que o espelho primário tem quase exatamente o mesmo diâmetro dos dois espelhos primários que o Departamento de Defesa dos Estados Unidos doou à NASA em 2012 para uso a bordo de satélites astronómicos (um dos quais voará no Wide Field Infrared Survey Telescope ou WFIRST ). Acredita-se que sejam espelhos originalmente fabricados para os satélites espiões KH-11. Os espelhos doados foram referidos como parte de um conjunto de três espelhos, embora o espelho terciário não tenha sido incluído na doação porque não era necessário para a missão de astronomia. O Telescópio Espacial Hubble também possui um espelho primário de 2,4 metros (os planos originais para utilizar um telescópio de 3 metros no Hubble aparentemente foram arquivados para unificar o desenho do espelho do Hubble com o do espelho dos satélites KH-11 e, assim, economizar custos).

Os principais elementos estruturais do telescópio parecem ter sido construídos internamente na RKTs Progress e por uma empresa chamada SKTB Plastik, que também constrói a estrutura composta do telescópio dos satélites Resurs-PM. Os actuadores piezoelétricos necessários para manter a forma adequada dos espelhos são fornecidos por uma empresa chamada “PO Start M.V. Protsenko”. Aparentemente, o principal papel da KMZ no projecto é integrar vários componentes entregues por outros subcontratados.

Também é possível identificar os sensores de imagem CCD que serão utilizados pela Sevan. Estes são chamados ‘Kem-PKh’ (Кемь-ПХ) e ‘Kem-MS’ (Кемь-МС) (‘Kem’ é o nome de um rio na República da Carélia, no noroeste da Rússia). Os sensores foram vinculados ao Razdan na documentação de aquisição da RKT citada na Internet aqui.

Os CCD são fabricados pela NPP Elar, que também produziu CCD para outros satélites de observação da Terra da RKT Progress, incluindo os satélites Persona, Resurs-P e Resurs-PM. Os CCD Kem foram brevemente mencionados em artigos apresentados pela NPP Elar em conferências de detecção remota realizadas em 2018 e 2019 (13 pág. 74, 14 pág. 78)

O primeiro artigo vincula erradamente os CCD aos satélites Resurs-PM, enquanto o segundo não os vincula a nenhum satélite específico. Ambos os artigos descrevem como CCD de Integração de Atraso de Tempo (Time Delay Integration TDI). O Kem-PKh tem um tamanho de pixel de 9×9 um2 e destina-se a imagens pancromáticas e o Kem-MS tem um tamanho de pixel de 18×18 um2 e destina-se a imagens multiespectrais em quatro canais. Os mesmos tamanhos de pixel CCD são vistos no sistema de imagem pancromática de alta resolução dos satélites Resurs-PM e no sistema de imagem multiespectral de média resolução (quatro canais). No entanto, estes CCD têm nomes diferentes, nomeadamente ‘Pribor-OEK-9’ e ‘Pribor-SR/Kombi’ e, portanto, podem não ser idênticos aos CCD da Sevan. Os ‘Pribor-OEK’ e ‘Pribor-SR’ foram programas de pesquisa realizados na primeira metade da década para desenvolver novas tecnologias para sensores de imagem da Terra de alta e média resolução, respectivamente. Embora pareçam ter sido voltados principalmente para os satélites Resurs-PM, alguns dos resultados também podem ter sido aplicados na Sevan.

Os CCD Kem também são objecto de vários contratos no sítio governamental zakupki.gov.ru. Estes mostram que os testes ambientais dos CCD foram subcontratados ao TsNII RTK (Centro Científico de Robótica e Cibernética Técnica), uma organização com sede em São Petersburgo que é mais conhecida por desenvolver sistemas de robótica espacial, bem como o sistema de controle de descida suave Kaktus das cápsulas espaciais Soyuz MS. Foi dada preferência a uma organização sediada em Moscovo denominada RNII Elektronstandart, que geralmente realiza esses tipos de testes.

Os subsistemas electrónicos para a carga óptica (conhecidos como “Sistema de Recepção e Conversão de Informações ou SPPI) são conjuntamente denominados ‘Sangur-2R/1’. Os sistemas análogos para os Resurs-DK1, Resurs-P e Resurs-PM são chamados ‘Sangur-1’, ‘Sangur-1U’ e ‘Step-29’ e foram todos desenvolvidos pela NPP OPTEKS, uma afiliada da RKTs Progress.

Outros sistemas

O principal sistema de propulsão é um sistema de combustível líquido desenvolvido pela KB Khimmash (as antigas ‘Oficinas de Isayev’), agora parte do Centro Khrunichev. É denominada “unidade de motor combinada” (ODU). A única documentação legal disponível refere acerca “da adaptação do ODU”, uma possível indicação de que a unidade do motor é uma versão modificada de uma anterior. Outros documentos mostram que a NIIMash, em Nizhnyaya Salda, fabrica propulsores para o Razdan denominada 11D428A-16. Estes são motores de 129 N que queimam UDMH/tetróxido de azoto que tem sido utilizado noutros veículos espaciais russos, incluindo os veículos Soyuz MS. Um documento menciona quatro conjuntos de motores para a “unidade de voo Razdan” “totalizando 100 motores”.

Documentos legais também revelaram que os satélites Razdan irão transportar um sistema de propulsão eléctrica. Porém, não foi possível identificar o fabricante do sistema, que poderá ser o OKB Fakel ou o Centro de Investigação Keldysh. A única informação útil que pode ser retirada da documentação é a de que o sistema irá utilizar tanques de xénon construídos pela NIIMash em Nizhnyaya Salda. A NIIMash é conhecida por ter produzido um tanque de xénon denominado MSKV-50.000.000 que já foi utilizado num número de satélites utilizando os motores de plasma estacionário SPD-100 da OKB Fakel. O desenvolvimento de um “sistema de controlo e de fornecimento de energia” para o sistema de propulsão eléctrico foi atribuído simultaneamente à NPTs Polyus e à AVEKS em Julho de 2014, aparentemente numa base competitiva.

Um documento da NIIMash também faz alguma luz sobre o propósito do sistema de propulsão eléctrico. Refere que a companhia fornece subsistemas de pequeno tamanho para a unidade de propulsão eléctrica, referindo ainda que será utilizado para ajustamentos orbitais precisos que tornará possível aumentar a resolução no solo do complexo orbital a bordo. Isto poderá significar que os satélites Razdan irá pelo menos periodicamente operar em órbitas muito baixas para obter a resolução máxima e regularmente utilizar o seu sistema eléctrico para contrariar o atrito pelo arrastamento atmosférico. Isto é reminiscente de testes levados a cabo pelo Japão com um satélite de observação experimental denominado Tsubame, que utilizou motores iónicos à base de xénon para contrariar o arrastamento aerodinâmico à medida que baixa a altitudes de 167 km. Os satélites Razdan podem muito bem ser os primeiros satélites de reconhecimento óptico a transportar um sistema de propulsão eléctrico.

Os satélites Razdan irão também estar equipados com um sistema de controlo de atitude electromecânico que tornará possível orientar o satélite sem consumir propolente. Este é fornecido pelo Instituto de Investigação Científica de Instrumentos de Comando (NIIKP) em São Petersburgo. A empresa fabrica giroscópios de controlo de momento (CMG), rotores que são colocados em rotação a constante velocidade e que são montados em suspensões para fornecer controlo de atitude. A 1 de Julho de 2014, foram atribuídos ao NIIKP contratos para elaborar o desenho preliminar para dois tipos de giroscópios de controlo de momento para os Razdan com um momento angular de 30 Nms e 250 Nms. Documentação posterior apenas menciona um CMG de 250 Nms (denominado SGK-250). Isto parece ser idêntico em performance a um CMG denominado 14M533, que é transportado pelos satélites Resurs-P e Persona (assim, presumivelmente estes serão dois nomes para um sistema idêntico). Os subsistemas para o SGK-250 são denominados Kardan (“Suspensão”) e MSSKM-016. MSSKM significa “Sistema Magnético para Descarga de Momento” e é necessário para dessaturar os CNG ao remover o excesso de momento angular do veículo espacial. O sistema MSSKM-016 será também instalado no satélite Ekipazk, um satélite nuclear desenvolvido pela KB Arsenal.

Outros subcontratores para os satélites Razdan incluem:

– TsNII Elektropribor: para um sistema inercial sem suspensão utilizando giroscópios electrostáticos (utilizados para determinção precisa de atitude);

– Instituto de Investigação Espacial (IKI): para sensores terrestres (BOKZ) e sensores solares (OSD) para serem utilizados no sistema de controlo de atitude;

– PAO Saturn: para células fotovoltaicas e baterias de iões de lítio para serem utilizados no sistema de fornecimento de energia. Segundo um documento, algumas das células foram testadas num modelo do painel solar dos satélites Persona no solo. De forma confusa, a NPP Kvant, outra companhia russa especializada em painéis solares, segundo o seu relatório anual de 2016, estudou a necessidade de importar células solares para o Razdan ao abrigo de um projecto de investigação denominado Razdan-N BF-E.

– NPTs Polyus e AVEKS: para o sistema de controlo de fornecimento de energia;

– Sistemas Espaciais Russos (RKS): para o sistema de telemetria a bordo (BITS);

– Instituto de Investigação Científica de Instrumentos de Precisão (NII TP): para o sistema de comando e medição (Topaz-R) e para o sistema de transmissão de alta velocidade;

– NII Submikron: presumivelmente para o sistema de computador de bordo;

– Instituto Russo de radio Navegação e Temporização (RIRV): para os sistemas de navegação a bordo (BSKVU-R);

– Instituto de Investigação Cientifica de Mecânica de Precisão (NII TM): para o desenvolvimento de um sistema denominado “Sistema de Eliminação de Informação” (SLI). Isto é definido com sítio na Internet da empresa como um sistema de operação autónomo que pode eliminar informação  (incluindo o que é denominado como “informação codificada”) em caso de certos parâmetros “excederam os limites aceitáveis”. Aparentemente inclui um conjunto de sensores especializados para monitorizar de forma contínua vários sistemas a bordo. Nos primeiros dias do programa espacial, a NII TM desenvolveu sistemas de destruição em para os veículos Vostok e Voskhod não tripulados, bem como para os satélites espiões Zenit para garantir que não aterrariam em território estrangeiro em caso de anomalia. Porém, como os Razdan são satélites não recuperáveis, pode ser assumido que o sistema SLI não é para este propósito.

O foguetão 14A14 Soyuz-2

O foguetão 14A14 Soyuz-2 representa a mais recente evolução do épico míssil balístico intercontinental R-7 desenvolvido por Sergei Korolev nos anos 50 do século passado. O novo lançador apresenta motores melhorados, modernosSoyuz-2_2014-03-23_14-08-06 sistemas aviónicos digitais e uma reduzida participação de componentes de fabrico não russo.

O lançador é também conhecido pela designação Soyuz-ST (quando lançado desde o CSG Kourou) e foi especialmente desenhado para uma utilização comercial, aumentando a seu desempenho geral apesar de o desenho básico do veículo permanecer o mesmo. As alterações foram realizadas ao nível de uma melhoria do desempenho dos motores do primeiro e do segundo estágio com novos injectores e alteração da mistura dos propelentes; aumento no desempenho do terceiro estágio; introdução de um novo sistema de controlo, permitindo uma alteração do plano orbital já durante o voo; introdução de um novo sistema de telemetria digital para a monitorização do lançador e a introdução de uma nova ogiva de protecção de carga com um diâmetro de 3,6 metros.

O foguetão 14A14 Soyuz-2 pode ser equipado com um quarto estágio, nomeadamente o estágio Fregat (nas suas diversas variantes), utilizando as carenagens de protecção do tipo ST e SF.

Para as missões OneWeb é utilizado um “sistema dispensador” de satélites desenvolvido pela RUAG Space AB (Linköping, Suécia). Este dispensador transporta os satélites durante o voo até à órbita terrestre baixa, libertando-os assim que a altitude e as condições ideais são atingidas. Este dispensador é projectado para acomodar até 36 satélites por lançamento.

Este lançador é capaz de colocar uma carga de 7.800 kg numa órbita terrestre a 240 km de altitude com uma inclinação de 51,80.º. No lançamento desenvolve uma força de 4.144.700 kN. A sua massa total é de 310.000 kg, o seu diâmetro no estágio principal é de 2,95 metros e o seu comprimento total é de 43,40 metros.

O primeiro estágio do 14A14 Soyuz-2 é composto pelos quatro propulsores laterais (Blok B, V, G e D) com uma massa bruta de 44.400 kg, tendo uma massa de 3.810 kg sem combustível. Cada propulsor tem um motor RD-107A (14D22) que desenvolve uma força de 1.021.097 kN (vácuo), com um Ies 310 s e um Tq de 120 s. Têm um comprimento de 19,60 metros, um diâmetro de 2,69 metros e consomem LOX e querosene.

O segundo estágio (Blok-A) tem um comprimento de 27,80 metros, um diâmetro de 2,95 metros, um peso bruto de 105400 kg e um peso sem combustível de 6.975 kg. Está equipado com um motor RD-108A que no lançamento desenvolve 999.601 kgf (vácuo), com um Ies de 311 s e um Tq de 286 s. Consome LOX e querosene.

Imagens: Ministério da Defesa da Rússia

O terceiro estágio (Blok-I) tem um comprimento de 6,74 metros, um diâmetro de 2,66 metros, um peso bruto de 25.200 kg e um peso sem combustível de 2.355 kg. Está equipado com um motor RD-0110 que no lançamento desenvolve 294.000 kgf (vácuo), com um Ies de 359 s e um Tq de 300 s. Consome LOX e querosene.

As modificações introduzidas no novo lançador foram sendo testadas em duas versões do mesmo veículo, o 14A14-1A Soyuz-2.1a e o 14A14-1B Soyuz-2.1b. Este último veículo é um lançador a três estágios no qual o motor RD-0124 é já empregado no último estágio.

Soyuz-2-1a 1

Com dimensões semelhantes ao motor RD-0110 utilizado nas versões anteriores dos lançadores Soyuz, o motor RD-0124 apresenta como principal diferença a introdução de um sistema de ciclo fechado no qual o gás do oxidante utilizado para propulsionar as bombas do motor é então direccionado para a câmara de combustão onde é queimado com restante propelente em vez de ser descartado. Esta melhoria no motor aumenta o desempenho do sistema e, como consequência, aumenta a capacidade de carga do lançador em 950 kg. Um propelente especial de ignição é utilizado para activar a combustão do motor e são utilizados dispositivos pirotécnicos para controlar o funcionamento do motor. Cada uma das quatro câmaras de combustão pode ser movimentada ao longo de eixos para manobrar o veículo.

A tabela seguinte mostra os últimos dez lançamentos do 14A14-1B Soyuz-2.1b sem qualquer estágio superior.

Lançamento Data de Lançamento

Hora (UTC)

Lançador Local de Lançamento Carga
2016-016 13/Mar/16

18:56:00,335

T15000-016
Baikonur

LC31 PU-6

Resurs-P 3
2017-076 02/Dez/17

10:43:26,331

77069203
GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2524

(14F145 Lotus-S1 n.º 803)

2018-082 25/Out/18

00:15:17,991

78031216
GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2528

(14F145 Lotus-S1 n.º 804)

2021-008 02/Fev/21

20:45:28,079

? GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2549

(14F145 Lotus-S1 n.º 805)

2021-056 25/Jun/21

19:50:00,241

? GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2550

(14F139 Pion-NKS n.º 901)

2021-111 24/Nov/21

13:06:35,047

Ya15000-054 Baikonur

LC31 PU-6

Progress M-UM/Prichal
2022-036 07/Abr/22

11:20:18,321

? GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-3

Cosmos 2554

(14F145 Lotus-S1 n.º 806)

2022-163 30/Nov/22

21:15

76093148 GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2565

(14F145 Lotus-S1 n.º 807)

Cosmos 2566

2023-165 27/Out/23

06:04:43

? GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-3

Cosmos 2570

(14F145 Lotus-S1 n.º 808)

Cosmos 2571

2023-182 25/Nov/23

20:58

? GIK-1 Plesetsk

LC43 PU-4

Cosmos 2572

Em 1996 tiveram início os testes do motor RD-0124 e foram finalizados em Fevereiro de 2004 nas instalações da Khimavtomatika em Voronezh. Nesta altura previa-se que a produção em série do novo motor teria início em 2005. A 27 de Dezembro de 2005 teve lugar outro teste do motor, abrindo caminho para os ensaios em grupo de todo o terceiro estágio do lançador 14A14-B Soyuz-2.1b nas instalações da NIIKhimMash em Sergiev Posad.

No início de 2005 a Arianespace anunciava que a primeira missão de teste do foguetão 14A14-1B Soyuz-2.1b teria lugar desde o Cosmódromo GIK-5 Baikonur para colocar em órbita o satélite astronómico CoRoT. Este lançamento dependeria dos resultados de novos ensaios do motor RD-0124 que tiveram lugar em Março e Abril de 2006. Um último teste teve lugar a 20 de Outubro de 2006 e o satélite CoRoT acabaria por ser lançado a 21 de Dezembro desse ano.

Dados estatísticos e próximos lançamentos

– Lançamento orbital: 6542

– Lançamento orbital Rússia: 3330 (50,90%)

– Lançamento orbital Plesetsk: 1662 (25,40% – 49,91%)

 

Tabela dos próximos lançamentos orbitais

Data

Hora (UTC)

Lançador Local Lançamento

Plt. Lançamento

(Recuperação)

Carga / Missão
6543 28 Novembro

04:00

Falcon-9

277

Cabo Canaveral SFS

SLC-40

(JRTI)

Starlink G6-30 (x23)
6544 28 Novembro

04:00

Electron/Curie

F42

“The Moon God Awakens”

Onenui (Máhia)

LC-1

QPS-SAR-5 “TSUKUYOMI-I”
6545 29 Novembro

??:??

Falcon-9

278

Vandenberg SFB

SLC-4E

425 Project EO/IR satellite 1

EIRSAT-1

6546 01 Dezembro

09:22:??

14A14-1A Soyuz-2.1a

M15000-067

Baikonur

LC31 PU-6

Progress MS-25
6547 01 Dezembro

??:??

Gushenxing-1

Y9

“We Won’t Stop”

Jiuquan

LC43/95A

Xingchi-1 02A “Sichen”

Xingchi-1 02B