A épica viagem da Apollo-11 (I)
A quando da separação entre os dois veículos, a massa do Columbia era de 16.625 kg e a massa do Eagle era de 15.253 kg. Em termos de massa sem combustível, o estágio de ascensão, com 2,179 kg, era 146 kg mais pesado do que o estágio de descida. O sistema de propulsão do estágio de descida tinha 8.165 kg de propolente. O estágio de ascensão tinha 2.365 kg de propolente para o seu motor principal e uma carga inicial de 274 kg de propolente para o sistema de controlo de atitude.
A T+101:36, cerca de 180º após a manobra de separação, e cerca de 2 da tarde na hora de Houston, o Eagle accionou os seus motores durante 7 segundos para abrandar e induzir uma força para fazer com que os propelentes ficassem em posição nos tanques principais. Os primeiros 15 segundos da queima DOI foram levados a cabo com o regulador de pressão DPS a 10% da sua potência de 4.763 kg, durante a qual o motor foi orientado para dirigir a força ao longo do centro de massa do veículo, e depois o computador aumentou o regulador de pressão para os 40% até atingir a velocidade necessária de 23,3 m/s – de forma nominal após uma duração total de 29,6 segundos. Como não havia qualquer som ou vibração a partir do motor ao nível de 10%, os instrumentos eram a única indicação de Armstrong e Aldrin para verificarem que a manobra havia sido conseguida, mas quando o regulador de pressão foi aumentado, os dois sentiram uma ligeira curvatura nos seus joelhos. Para os fixar enquanto se encontravam ‘de pé’ durante as manobras, as solas das suas botas dos fatos pressurizados tinham velcro para fixar com tiras no solo, e eles seguravam-se através de arnês com molas fixados em laços nos seus peitos. Se eles tivessem a necessidade de se segurarem, os dois homens tinham barras nas paredes e existiam descansos para os controlos manuais. A órbita de descida tinha o seu ponto mais alto a 105,9 km de altitude e o seu ponto mais baixo a 15,7 km de altitude. Como a manobra era levada a cabo 7 minutos após a passagem do horizonte, o ponto mais baixo da órbita seria sobre o Mar da Tranquilidade, cerca de 16.º (481,6 km) a Este do local de descida, onde, se tudo corresse bem, o Eagle iria iniciar a descida propulsionada. Até esse momento Armstrong e Aldrin iriam percorrer o mesmo caminho já percorrido pela Apollo-10.
À medida que o Eagle ia perdendo altitude na órbita de descida, ia ganhando velocidade e avançando em direcção à superfície, continuando a descer, o seu sistema primário de orientação e navegação (PGNS) foi informado para manobrar o veículo para uma altitude calculada de forma a colocar o Sol no campo de visão do telescópio de navegação. Se a mira estivesse centrada no disco solar (que tinha uma dimensão de meio grau de arco) isto confirmaria que a plataforma não se havia desviado do alinhamento levado a cabo pelo Columbia como parte dos procedimentos levados a cabo antes da separação entre os dois veículos. Caso fosse determinado um desvio significativo, a plataforma teria de ser realinhada levando-se a cabo observações de estrelas, o que levaria algum tempo. Enquanto a mira se mantivesse no disco solar, Armstrong iria aceitar o alinhamento; e tal foi como aconteceu. Aldrin verificou depois que o sistema de orientação de abortagem (AGS), que utilizava giroscópios em vez de plataformas inerciais, estava de acordo de forma satisfatória com o PNGS. Entretanto, Collins usava o seu sextante para monitorizar o Eagle à medida que se afastava, para verificar que seria capaz de levar a cabo medições de longa distância precisas caso tivesse socorrer o LM. Por altura da queima DOI os dois veículos estavam afastados cerca de 335 metros, e apesar de o Eagle se movimentar para a frente à medida que descia em direcção ao ponto mais baixo da sua órbita, o Columbia, numa órbita mais elevada, foi o primeiro a ficar em linha de vista com a Terra. Devido ao seu desenho, existia uma redundância na cobertura, dado que apesar da Lua se iria cedo pousar para a estação de escuta de Madrid já se havia levantado para a estação de Goldstone.
“Columbia, Houston”, chamou Duke. “Aguardamos.”
“Escutamos alto e em bom som,” respondeu Collins. “E a mim?”
“Lindamente, Mike”, respondeu Duke, utilizando um código rádio para ‘alto e bom som’. “Que tal correu?”
“Tudo correu de forma suave. Lindamente.”
“Muito bem. Aguardamos o Eagle,” disse Duke.
“Já vem de seguida.”
“Esperamos perder o teu alto-ganho durante a descida propulsionada.”
“Mas não te importas muito, pois não?” observou Collins.
“Não senhor.”
Como Collins seguia o Eagle com o seu sextante, a sua atitude em relação à Terra ia-se alterando, e apesar de a antena de alto ganho ser orientável, a certa altura durante a manobra o seu campo de visão seria bloqueado e o Columbia teria de mudar para as antenas omnidireccionais, e nessa altura o envio de telemetria seria perturbado.
Quase dois minutos após a aparição do Columbia, o Eagle, agora a 33 km, fazia o seu relatório.
“Aguardamos o relatório sobre a vossa queima,” dizia Duke.
“A queima decorreu na hora certa,” respondeu Aldrin.
“Começamos da melhor maneira,” disse Kranz à sua equipa. “Tenham calma.”
A quando do AOS, Joan Aldrin deixou o sofá para ficar de pé junto da lareira, colocando os seus braços na cornija e descansando a sua cabeça nas suas mãos, Clare Schweickart fez com que o seu marido, o astronauta Rusty Schweickart, prometesse alertar toda a gente se escutasse algo fora do normal na coluna de som. Rusty estava sentado com Gerry Carr, plano de voo aberto. O filho de Aldrin, Mike, estava no andar de cima, assistindo noutro televisor.
Vista do Módulo Lunar durante a descida propulsionada para a superfície da Lua.
As comunicações com o Eagle eram fracas, com muita estática na ligação de voz e com telemetria intermitente. “Columbia, Houston,” chamou Duke “Perdemos todos os dados do Eagle. Por favor faz com que volte a adquirir a antena de alto ganho.”
“Eagle, aqui Columbia. Houston quer que voltem a adquirir o alto ganho. Eles perderam os dados.” Nenhuma resposta. “Eagle, escutaram o Columbia?”
Aldrin ajustou o sistema que deveria orientar a antena para manter o sinal mais forte, e a estática desapareceu. “Como é que nos ouves agora?”
“Five-by,” respondeu Duke.
Faltavam 13 minutos para o início da descida propulsionada (PDI).
A tripulação do Eagle estava agora a viajar com ‘os pés à frente’ e com as ‘janelas para baixo’ para permitir a Armstrong verificar as marcas no solo verificadas pelas missões prévias. Isto não só confirmava a sua rota, mas também proporcionava uma estimativa da sua altitude como uma verificação do ponto mais baixo da órbita. Isto é, ao usar um relógio para medir os intervalos de tempo entre uma série de marcas no solo que passavam através das referências angulares inscritas numa janela, lendo a sua velocidade no computador, e referenciando em relação a um mapa preparado por Floyd Bennett, um engenheiro de Houston, ele poderia estimar a altitude e, por extrapolação, estimar a altitude no ponto mais baixo da sua órbita. Esta técnica manual podia medir esta parâmetro vital de forma mais precisa do que os dados obtidos pelo Manned Space Flight Network. Entretanto, Aldrin estava a utilizar o radar de aproximação para medir a distância ao Columbia para calcular a sua altitude relativa à sua órbita. Se eles iniciassem a descida a partir de um ponto demasiado alto, então o Eagle ficaria sem combustível antes de terminar a descida. Concluiu-se que o ponto mais baixo da órbita deveria ocorrer a uma altitude de 15.545 m e logo antes o ponto do PDI, que seria tão bom como alguém poderia esperar. Se o ponto mais baixo da órbita fosse demasiado elevado, o Eagle teria de adiar o PDI nesta passagem e levar a cabo uma manobra no ponto mais elevado da órbita para aprumar o ponto mais baixo da órbita para tentar de novo na passagem seguinte. Collins estava a seguir o Eagle utilizando o seu sextante, mas no tempo para o PDI, com a separação agora em cerca de 185 km e o LM sendo um pequeno ponto movendo-se rapidamente em relação à paisagem lunar iluminada pelo Sol, acabou por perdê-lo.
A decisão de prosseguir para o PDI estava prevista para ter lugar cinco minutos após ter surgido do limbo lunar, e durante este intervalo de tempo os controladores de voo deveriam fazer uma verificação final dos sistemas do Eagle. Porém, com uma decisão eminente, as comunicações deterioraram-se de novo. “Columbia, Houston,” chamou Duke “Perdemos o Eagle de novo. Eles que tentem o alto ganho.”
“Eagle, aqui Columbia. Houston perdeu-vos de novo. Eles pedem outra tentativa no alto ganho.”
O sinal melhorou.
“Não sei qual era o problema aqui,” disse Aldrin. Existia um mostrador a bordo para indicar a forma como a antena estava orientada para manter o sinal o mais forte possível. “A orientação começou a oscilar em torno da direcção da nossa rota.”
“Nós iremos ver o que se passou,” prometeu Duke.
As comunicações intermitentes eram preocupantes. Tendo em conta o elevado número de despenhos durante as simulações, Kranz adicionou uma regra de missão que referia que deveria haver um sinal de telemetria adequado para permitir uma investigação para determinar a razão para um despenho. Adicionou uma outra regra que dizia que cabia ao director de voo decidir se esta condição era satisfeita. Tal como com a ligação por voz, a telemetria estava a ‘desaparecer’ e os monitores dos controladores estavam a ficar estáticos, e sem a telemetria os controladores de voo não podia julgar as melhores decisões. As restrições de energia permitiam o PDI apenas em duas passagens consecutivas na parte mais baixa da órbita após o DOI. Uma opção (na ausência de outros problemas) era prosseguir com a descida e reavaliar após cinco minutos se deveriam prosseguir ou abortar. Kranz estava perante a decisão se seria melhor seguir esta opção e possivelmente terminar abortando a descida, ou adiar na esperança de que as comunicações pudessem melhorar na passagem seguinte.
Raciocinando de que com as ‘janelas para baixo’, a antena colocada num mastro no lado direito do veículo pudesse ter dificuldades em emitir de forma clara em linha de visai com a Terra, Pete Conrad sugeriu a Duke que o Eagle manobrasse ligeiramente para melhorar a geometria de comunicação (O que ninguém se apercebeu era que o programa que orientava a antena estava com um erro, resultando que em certas altura o que se esperava ser uma linha de visão limpa para a Terra estava bloqueada pela estrutura do veículo. Para o LM esta manobra significava uma rotação em torno do seu eixo de propulsão). Duke passou a informação a Kranz que por sua vez perguntou a Puddy que concordou. Duke chamou então, “Eagle, Houston, Recomendamos que façam uma rotação de 10.º à direita para nos ajudar com a força do sinal de alto ganho.” Não houve qualquer resposta do Eagle e a estática continuou. Kranz deu à sua equipa mais 30 segundos para inspeccionar a telemetria mais recente, e então anunciou, “Muito bem, todos os controladores de voo, autorização para a descida propulsionada. Retro?”
“Vai!” respondeu Deiterich.
“FIDO?”
“Vai!” respondeu Greene.
“Guidance?”
“Vai!” respondeu Bales.
“Control?”
“Vai!” respondeu Carlton.
“TELCOM?”
“Vai!” respondeu Puddy.
“GNC?”
“Vai!” respondeu Willoughby.
“EECOM?”
“Vai!” respondeu Aaron.
“Cirurgião?”
“Vai!” respondeu Zieglschid.
“CapCom vamos para a descida propulsionada” declarou Kranz.
“Eagle, Houston,” chamou Duke “se nos escutam, podem iniciar a descida propulsionada.”
Não escutando qualquer resposta, Collins retransmitiu a informação de Houston “Eagle, Columbia. Eles acabaram de dizer que podem prosseguir com a descida propulsionada.”
Não escutando qualquer resposta, Duke pediu a Collins para passar a sugestão da manobra anterior “Eagle, aqui Columbia. Eles recomendam que manobrem 10.º para a direita e que tentem a antena de alto ganho novamente.” Qualquer resposta foi perdida, mas Armstrong levou a cabo a manobra, que reduziu a estática. “Eagle, escutam o Columbia?” questionou Collins.
“Escutamos,” confirmou Aldrin.
Com as comunicações restabelecidas, e a faltar quase 4 minutos até à realização da manobra, Duke repetiu que a ordem anterior, “Eagle, Houston. Já vos escutamos agora. Podem avançar para a PDI.”
“Roger”, respondeu Aldrin.
Armstrong e Aldrin rodaram as suas cabeças dentro dos capacetes mirando-se mutuamente e anuíram – eles iam ter a hipótese de alunar! Para eliminar a situação de ter de pressionar um botão de cada vez que quisessem falar (Push-To-Talk mode), Aldrin colocou o seu microfone em VOX. Isto permitiria a Houston escutar tudo o que Aldrin dizia, mas Armstrong só seria escutado quando premisse o botão na ligação eléctrica do seu fato ou, mais tarde, no controlador manual.
“Flight, FIDO,” chamou Greene. “MSFN mostra que podemos estar um pouco baixos.”
“Rog.” Respondeu Kranz.
“Não é problema,” adicionou Greene.
Na divisão de tarefas entre os tripulantes do Eagle, Aldrin deveria operar o computador e monitorizar os sistemas, servindo como os olhos de Armstrong dentro do veículo para permitir que o Comandante pudesse manter a sua atenção no exterior. A câmara Maurer de 16 mm estava instalada na janela de Aldrin para gravar a descida em filme colorido Ektachrome. Tinha uma lente com uma distância focal de 10 mm com uma abertura angular de 55.º na horizontal e 41.º na vertical. Dois minutos antes da PDI, Aldrin activava a câmara. “A câmara sequencial está activada.” A 6 fotogramas por segundo, os cerca de 43 metros de filme deveriam durar 15 minutos, o que era suficiente para um perfil de descida nominal (Havia um corpo da máquina Maurer suplente e Aldrin havia testado ambas as câmaras durante a sua inspecção levada a cabo mais cedo no início da missão; a câmara suplente não era necessária e foi descartada com o lixo após o passeio lunar).
Puddy recomendou novos ângulos para a antena orientável. Duke transmitiu esses ângulos, e um momento mais tarde Aldrin referia “Penso que vos tenho no alto ganho agora.”
Com um minuto apenas, Kranz levou a cabo uma volta final de verificações.
“As comunicações são boas, TELCOM?”
“São mesmo fracas, Flight,” respondeu Puddy. Apesar de a ligação de alto ganho ser agora contínua, o sinal ainda era fraco.
“Muito bem, como é que vocês estão? Os vossos sistemas estão prontos?”
“Afirmativo, Flight,” respondeu Puddy.
“E tu, Control?”
“Estamos bem,” respondeu Carlton.
“Guidance, estamos felizes?”
“Vai, ambos os sistemas,” respondeu Bales, significando que tanto o PNGS e o AGS eram satisfatórios.
“E tu, FIDO?”
“Vamos,” respondeu Greene. Então, ele repetiu a indicação da telemetria a partir do Manned Space Flight Network, “Estamos um pouco baixos, Flight; sem problemas.”
Após 22 segundos de silêncio na ligação do director de voo, Kranz avisou, “Muito bem todos os controladores de voo, 30 segundos para a ignição”.
Enquanto enviava telemetria, a antena orientável do Eagle não tinha a capacidade de enviar sinal de televisão. As redes de televisão haviam decidido passar a ligação de áudio juntamente com animações técnicas fornecidas pela NASA, seguindo assim a linha de eventos da missão (De notar que isto teve lugar muito antes do advento das imagens geradas por computador, na actualidade estas animações pareceriam muito modestas). O Eagle iria iniciar a queima com o motor na direcção de voo para servir como um travão, e somente depois de eliminar a maior parte da sua velocidade horizontal se iria reorientar para levar a cabo uma descida mais íngreme que se iria alterar até ficar a ‘pairar’ sobre a superfície lunar para a selecção do melhor local, sobre o qual iria fazer a descida vertical final.
(Continua)