Em 1965 o mundo vivia o calor da Guerra Fria entre a União Soviética e os Estados Unidos. O espaço era então o principal palco de propaganda para os dois blocos que se lutavam para atingir o domínio tecnológico. Empolgada pelos avanços iniciais na Corrida Espacial, a União Soviética preparava-se para um novo feito espectacular em órbita terrestre no que parecia um plano para uma futura missão lunar.
Um dos passos necessários para um dia se chegar à Lua, era o domínio das tecnologias extraveículares que permitissem a um cosmonauta operar em segurança no exterior do seu veículo espacial. Puxando os limites das cápsulas Vostok, Sergei Korolev preparava-se para o próximo passo, vencendo mais uma vez os Estados Unidos que em Fevereiro de 1965 anunciavam que iriam realizar o primeiro passeio espacial num período de três meses.
Após o triunfante voo da Voskhod tripulada por três cosmonautas em Outubro de 1964, Sergei Korolev implementou uma equipa no OKB-1 com a tarefa de desenvolver um veículo modificado com a capacidade de proporcionar uma saída em segurança para o espaço exterior e permitir o seu regresso á segurança do interior da cápsula espacial. O engenho dos especialistas Soviéticos acabaria por desenvolver uma escotilha extensível, bem como um sistema de suporte de vida para a tripulação que era especialmente projectado para as actividades extraveículares. O sistema seria utilizado na épica missão da Voskhod-2, mas teria de ser testado antes.
O veículo Voskhod-3KD n.º 1 seria equipado com um equipamento em tudo semelhante ao que viria a ser utilizado mais tarde. Lançado às 0740:48UTC do dia 22 de Fevereiro de 1965 pelo foguetão 11A57 Voskhod (R15000-03) a partir do Complexo de Lançamento LC1/1 do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur, receberia a designação Cosmos 57 após atingir a órbita terrestre. Colocada numa órbita com um perigeu a 175 km de altitude, apogeu a 512 km de altitude e inclinação orbital de 64,77º, a missão tinha como objectivo de ser uma preparação tecnológica para o primeiro passeio espacial.
O Cosmos-57 foi colocado na órbita prevista para simular o programa da futura missão Voskhod-2, incluindo a abertura e implementação da escotilha, verificação dos sistemas de bordo, e os procedimentos e aterragem do veículo de regresso.
Os procedimentos de abertura da escotilha foram levados a cabo sem qualquer problema: verificação e extensão da escotilha, transferência de ar desde o veículo de descida para a escotilha, despressurização, activação do fornecimento de oxigénio para o fato espacial, abertura e fecho da escotilha exterior, repressurização e ejecção do conjunto da escotilha na 16ª órbita.
Apesar das dúvidas sobre a operação e funcionamento do sistema de saída para o espaço exterior, todos os procedimentos foram levados a cabo sem problemas, excepto a ejecção da escotilha pois a missão não iria terminar como previsto.
Por razões desconhecidas, o programa de regresso foi iniciado e o sistema de retrotravagem activado. No entanto, como o Cosmos 57 se encontrava numa atitude errada no início da manobra, o satélite acabaria por ser colocado numa órbita incorrecta após o final da manobra. Isto levou a que o dispositivo de auto-destruição fosse activado, destruindo o veículo.
A causa para o envio do comando para a reentrada permaneceu um mistério até dias mais tarde quando se procedeu à análise da telemetria. O relatório sobre os acontecimentos que levaram à perda do Cosmos 57 foi apresentado a 25 de Fevereiro por Armen S. Mnatsakanyan, Desenhador Chefe do NII-648 responsável pela instrumentação de telemetria, e por Amos A. Bolshoy, Chefe do Grupo de Operações e Controlo para as missões Voskhod. Os resultados do inquérito levado a cabo indicaram um erro no controlo no solo. Segundo o plano original, o controlador numa das estações no solo localizado no Ponto de Medição n.º 6 (IP-6) situado em Yelizovo, Kamchatka, enviou uma mensagem (o Comando n.º 42) para transferir oar para a escotilha. Por uma simples coincidência e ao contrário das ordens, um controlador situado numa estação suplente (a estação IP-7 localizada em Klyuchi, Ussurisk), enviou o mesmo comando codificado no mesmo exacto momento. Os dois comandos foram recebidos pelo Cosmos 57 de forma simultânea, tornando-se num novo comando, n.º 5 – o comando para a descida.
Apesar de não haver assim qualquer problema com o veículo em sim, a verdade é que a missão não havia sido totalmente concretizada faltando o teste dos procedimentos de ejecção da escotilha e o teste dos procedimentos de regresso e reentrada. Especialmente os testes dos procedimentos de reentrada eram fulcrais para a missão tripulada, pois a cápsula iria regressar à Terra com o anal base da escotilha ainda fixado na fuselagem da cápsula e era necessário analisar os efeitos deste novo elemento no perfil de reentrada.
Os testes deste novo elemento não haviam corrido como planeado: quando uma versão de teste do módulo de descida foi largado a partir de um avião em Feodosiya, o sistema do pára-quedas falhou e a cápsula esmagou-se no solo, Por outro lado, outra escotilha, a que seria utilizada na missão tripulada, foi destruída a 13 de Janeiro quando foi acidentalmente largada para o chão durante a montagem no veículo espacial. Assim, a fiabilidade da cápsula de regresso permanecia por ser avaliada. Aparentemente, a presença do anel de base da escotilha induzia severas rotações em torno do eixo principal da cápsula durante a descida por pára-quedas. Eram necessários mais testes tanto no solo como em voo.
Os erros que levaram à destruição do Cosmos 57 foram corrigidos e o programa de voo acabaria por ser finalizado na missão do Cosmos 59, um satélite militar do tipo Zenit-4 colocado em órbita às 0859:28UTC do dia 7 de Março de 1965 pelo foguetão 11A57 Voskhod (R15001-05) a partir do Complexo de Lançamento LC31/2 do Cosmódromo de Baikonur. A missão confirmaria os procedimentos de correcção dos problemas encontrados no Cosmos 57 por parte do OKB-1 com uma aterragem bem sucedida a 15 de Março a 170 km a Sul de Kustanay, Cazaquistão.
Assim, os resultados das missões do Cosmos 57 e do Cosmos 59 abriram o caminho para o histórico passeio espacial do cosmonauta Alexei Arkhipovich Leonov a 18 de Março de 1965.
Imagens: Roscosmos