China lança terceiro módulo da estação espacial Tiangong

A China colocou em órbita com sucesso o terceiro módulo da sua estação espacial Tiangong.

O lançamento do módulo Mengtian (梦天) teve lugar às 0737:23,191UTC do dia 31 de Outubro de 2022 e foi realizado pelo foguetão Chang Zheng-5B (Y4) a partir do Complexo de Lançamento LC101 do Sítio de Lançamentos Espaciais de Wenchang, província de Hainan.

Todas as fases do lançamento decorreram como previsto e o Mengtian foi colocado numa órbita com um perigeu a 170 km de altitude, apogeu a 339 km de altitude e inclinação orbital de 41,5.º. A partir desta órbita, o módulo executou uma série de manobras que terminaram com a acoplagem com o módulo Tianhe da estação espacial Tiangong às 2027UTC do dia 31 de Outubro. A 3 de Novembro o módulo é colocado na sua posição definitiva, com a estação Tiangong a adquirir a forma de ‘T’.

Após se separar do porto de acoplagem axial do Tianhe, o braço robot começou a recolocar o módulo Mengtian às 0048:19UTC. Pelas 0117:35UTC a acção do braço robot estava completa, separando-se às 0126:06UTC.

O módulo Mengtian

Os módulos Wentian e Mengtian são módulos científicos pressurizados construídos a partir das experiências obtidas com o módulo orbital Tiangong-2 e serão utilizados para realizar experiências nas áreas das ciências da vida, biotecnologia, física, ciências dos materiais, micro gravidade, etc. Para além das experiências localizadas no interior pressurizado, ambos os módulos serão capazes de albergar experiências exteriores tanto e plataforma de exposição ao ambiente espacial, como fixadas nas respectivas fuselagens. Os módulos serão acoplados no porto de acoplagem axial do módulo Tianhe e posteriormente transferidos para um porto lateral utilizando um sistema de manipulação remota operado a partir do interior da estação espacial ou de forma remota a partir do centro de controlo.

O módulo Wentian está equipado com sistemas de controlo adicionais que poderão ser utilizados caso surja algum problema com o Tianhe. O módulo Mengtian possui funções similares ao Wentian, mas está equipado com uma escotilha especial para permitir as entrada e saída de carga e instrumentos com o auxílio dos tripulantes ou de forma autónoma utilizando o sistema de manipulação remota. O seu comprimento é de 17,9 metros, com uma massa de cerca de 23.000 kg e um volume pressurizado de cerca de 110 m3, tendo 32 m3 de volume habitável.

O Mengtian está dividido em quatro submódulos, sendo estes o módulo pressurizado, módulo de carga, a escotilha e o módulo de serviço.

O módulo pressurizado tem um comprimento de 9,3 metros com um segmento cilíndrico de 6,6 metros e uma largura de 4,2 metros. Está equipado com o mecanismo de acoplagem de um mecanismo de recolocação. O seu interior é dividido em três segmentos para trabalho, exercício físico e armazenamento. No seu interior estarão localizados treze contentores de investigação, dos quais 10 foram lançados no seu interior.

O módulo de serviço tem um comprimento de 5,1 metros e uma largura de 2,5 metros. Está equipado com sistemas de fornecimento de energia, comunicações e propulsão. Os painéis solares são semelhantes aos utilizados no módulo Wentian, tendo um comprimento de cerca de 56 metros, gerando 6.750 W.

O módulo Mengtian está equipado com um sistema de colocação de CubeSat em órbita utilizado o sistema de manipulação remota (braço-robot) e no seu exterior existem 37 adaptadores para a colocação de experiências.

 

A representação dos módulo Mengtian (Space Shuttle Almanac)

No total, haverá dezesseis prateleiras experimentais (racks) entre o módulo principal, os dois módulos experimentais e uma plataforma externa de experimentos. As prateleiras experimentais terão cerca de 1,8 metros de altura, 1 metro de largura e 0,9 metros de profundidade, pesando menos de 500 kg.

Os diferentes contentores experimentais na estação espacial Tiangong (CNSpaceflight)

Um outro módulo experimental, o Xuntian (Cruzador dos Céus), será um telescópio espacial com um espelho de dois metros de diâmetro. O módulo não estará acoplado ao complexo Tiangong, mas orbitando perto da estação, poderá ser acoplado à mesma para operações de reparação. Será usado para estudar o mecanismo de expansão acelerada do universo, para estudos sobre a energia e matéria escura, e a origem e evolução do universo.

A estação espacial será regularmente abastecida com os veículos de carga Tianzhou, cujo primeiro foi lançado em Abril de 2017 para a estação espacial Tiangong-2. Após o lançamento do módulo Tianhe, a China irá lançar o veículo de carga Tianzhou-2 que será colocado em órbita por um foguetão Chang Zheng-7.

Experiências na Tiangong

No âmbito da cooperação espacial entre a China e várias nações, foram selecionadas nove experiências a serem realizados a bordo da estação espacial Tiangong. O processo de seleção das experiências foi organizado com o Escritório das Nações Unidas para Assuntos do Espaço Exterior (UNOOSA – United Nations Office for Outer Space Affairs).

Essas experiências cobrem as áreas da astronomia, física de fluidos em microgravidade e combustão, ciências da Terra, tecnologia espacial, e ciências e tecnologia da vida espacial.

As experiências na área de astronomia vão estudar explosões de raios gama (Suíça, Polónia, Alemanha e China) e farão investigação espectroscópica do gás nebular (Índia e Rússia). As experiências de física e combustão de fluidos em microgravidade estudarão o comportamento de fluídos parcialmente miscíveis em microgravidade (Índia e Bélgica), usarão um sistema de resfriamento Micro 2-Phase de alto desempenho para aplicações espaciais (Itália e Quénia) e estudarão as instabilidades de chama afetadas por vórtices e ondas acústicas (China e Japão).

Vindo do México, a experiência em ciências da Terra vai usar uma plataforma de infravermelho médio para observações da Terra, e a experiência em tecnologia espacial (Arábia Saudita) vai estudar o desenvolvimento de células solares com multijunções GaAs para aplicações espaciais.

As ciências da vida espacial e as experiências de tecnologia vão estudar tumores no espaço (Noruega, França, Holanda e Bélgica) e o efeito da microgravidade no crescimento e produção de biofilme de bactérias causadoras de doenças (Peru e Espanha).

O foguetão Chang Zheng-5B

Tendo como objectivo a capacidade de possuir um lançador espacial capaz de orbitar cargas pesadas para a órbita de transferência geossíncrona (GTO) e para a órbita terrestre baixa (LEO), a China aprovou o desenvolvimento da família de lançadores Chang Zheng-5 em Junho de 2004. A nova família de lançadores deveria ser capaz de garantir as necessidades do futuro mercado de serviços de lançamentos orbitais, seria utilizada para colocar em órbita os módulos de uma grande estação espacial, iria ajudar a manter o desenvolvimento da tecnologia de lançadores espaciais da China, e impulsionar o desenvolvimento de tecnologias e da economia relacionada com o desenvolvimento de novos motores espaciais, novas tecnologias de soldagem, sistemas de controlo melhorados, etc.

O novo programa de desenvolvimento iria projectar uma nova série de veículos em vez de um lançador destinado a uma missão específica, para assim melhorar a capacidade da China para a ceder ao espaço. O novo programa iria aplicar tecnologias avançadas, tais como o desenvolvimento de um estágio de grande diâmetro e de motores mais potentes para aumentar a capacidade de lançamento de forma dramática, com o objectivo de lançar cargas de 25.000 kg para a LEO e de 14.000 kg para a GTO. O novo programa iria também projectar uma série de veículos tendo por base o princípio da generalização, serialização e modularização, com o propósito de suprimir as necessidades de lançar diferentes cargas. Os novos veículos lançadores deveriam utilizar propelentes não tóxicos e não poluentes, devendo ter um baixo custo, alta fiabilidade, e serem convenientes para ensaios e operacionalidade.

O novo sistema de lançamento da China tinha por base um conceito de modular utilizando dois novos motores e três módulos standard. Originalmente, o plano incluía três classes principais com variantes tendo um diâmetro de 5 metros, variantes com um diâmetro de 3,35 metros e uma configuração com um diâmetro de 2,25 metros.

Os três módulos standard eram o módulo H5-1 (5 metros de diâmetro com um comprimento de 31,0 metros e equipado com dois motores de LH/LOX de 50.000 kg, tendo uma massa de 175.000 kg), o módulo K3-1 (3,35 metros de diâmetro com um comprimento de 26,3 metros e equipado com dois motores de querosene/LOX de 120.000 kg, tendo uma massa de 147.000 kg) e o módulo K2-1 (2,25 metros de diâmetro com um comprimento de 25,0 metros e equipado com um motor de querosene/LOX de 120.000 kg, tendo uma massa de 69.000 kg).

Destes conceitos iniciais, derivaram os foguetões Chang Zheng-6 e Chang Zheng-7. Foi proposta uma série de variantes para o lançador de maior capacidade. Utilizando o estágio de 5 metros de diâmetro e diferentes configurações dos propulsores laterais e um estágio superior, foram propostas seis variantes para atingir diferentes capacidades de carga: Configuração A seria capaz de lançar 18.000 kg para a LEO, enquanto que a Configuração B e C seriam capazes de lançar 25.000 kg e 10.000 kg para a LEO, respectivamente. Para a órbita GTO, a Configuração D seria capaz de lançar 10.000 kg, enquanto que a configuração E e F seriam capazes de lançar 14.000 kg e 6.000 kg, respectivamente.

Eventualmente, somente duas variantes foram desenvolvidas: a variante básica do Chang Zheng-5 de dois estágios projectada para missões para a órbita GTO, e a variante de um único estágio (Chang Zheng-5B) para missões para a órbita terrestre baixa. Ambas as variantes estão equipadas com propulsores laterais de combustível líquido com um diâmetro de 3,25 metros. A variante básica do novo lançador é um veículo de dois estágios (5 metros de diâmetro) com quatro propulsores laterais (3,35 metros de diâmetro), sendo capaz de lançar 14.000 kg para GTO. O seu comprimento total é de 56,97 metros, massa de 869.000 kg e desenvolvendo 10.573 kN no lançamento.

O foguetão Chang Zheng-5B é um veículo de um estágio central (5 metros de diâmetro) com quatro propulsores laterais (3,35 metros de diâmetro), sendo capaz de lançar 22.000 kg para uma órbita terrestre baixa. O seu comprimento total é de 53,7 metros, massa de 837.500 kg e desenvolvendo 10.573 kN no lançamento.

Imagem: Junior Miranda

O voo inaugural do CZ-5 estava inicialmente previsto para 2013, mas a Academia Chinesa de Tecnologia de Veículos Lançadores (CALT) e a Academia de Tecnologia de Voo Espacial de Xangai (SAST) tiveram de percorrer um duro caminho para a primeira missão. Enfrentando desafios tecnológicos enormes, o desenvolvimento dos motores YF-77 e YF-100 iria atrasar o desenvolvimento da nova família de lançadores.

O voo inaugural do CZ-5B teve lugar às 10:00:27.092UTC do dia 5 de Maio de 2020 com o veículo Y1 a colocar em órbita o protótipo da futura cápsula espacial tripulada da China (Xinyidai Zairen Feichuan Shiyan Chuan).

Os componentes do lançador são fabricados na cidade industrial de Tianjin e depois transportados para o local de lançamento utilizando dois navios de carga construídos para esse efeito, o Yuanwang-21 e o Yuanwang-22. Os componentes são depois descarregados no porto de Qinglan que serve o Centro de Lançamentos Espaciais de Wenchang.

O primeiro estágio tem um comprimento de 31,02 metros e um diâmetro de 5,00 metros. Está equipado com dois motores YF-77 que consomem LOX/LH. O primeiro estágio tem uma massa de 175.800 kg, tendo uma massa de 17.800 kg sem propelentes.

O motor YF-77, desenvolvido pela Academia de Tecnologia de Propulsão de Lançamentos Aeroespaciais, é um motor de alta performance e altamente fiável projectado para os foguetões Chang Zheng-5. É o primeiro motor criogénico de alta-força desenvolvido pela China, dando um grande passo tecnológico tendo em conta os anteriores motores deste tipo, tais como o YF-75 que é utilizado nos estágios superiores dos foguetões Chang Zheng-3A e Chang Zheng-3B. Cada YF-77 proporciona 700 kN de força no vácuo e 510 kN de força ao nível do mar, tendo um impulso específico de 430 segundos (vácuo) e 310,2 segundos (nível do mar). O tempo de queima é de 520 segundos.

Os propulsores laterais têm um comprimento de 26,28 metros e um diâmetro de 3,25 metros. Cada propulsor está equipado com dois motores YF-100. Cada propulsor tem uma massa de 147.000 kg, tendo uma massa de 12.000 kg sem propelentes. O YF-100 consome querosene e LOX.

O desenvolvimento do YF-100 teve início em 2000 na Academia de Tecnologia de Propulsão Espacial Líquida. O motor foi certificado para Administração Estatal para a Ciência, Tecnologia e Industria para Defesa Nacional em Maio de 2012. É um motor de combustão de ciclo escalonado que desenvolve 1.199,48 kN ao nível do mar (1.339,48 kN no vácuo) com um impulso específico de 300 segundos (335 segundos no vácuo). O motor é também utilizado no foguetão CZ-6 Chang Zheng-6.

O segundo estágio tem um comprimento de 12,00 metros e um diâmetro de 5,00 metros. Está equipado com dois motores YF-75D que consomem LOX e LH. O segundo estágio tem uma massa de 26.000 kg, tendo uma massa de 3.100 kg sem propelentes a bordo.

O motor YF-75D desenvolve 88,26 kN no vácuo e tem um impulso específico de 442 segundos. O seu tempo de queima é de 780 segundos.

O estágio superior YZ-2 Yuanzheng-2 é um novo estágio superior desenvolvido especificamente para o CZ-5 pelo CALT. A sua função é a de transportar a carga da missão para a sua órbita sem que esta tenha de gastar o seu próprio propelente para atingir a órbita operacional. O seu diâmetro é de 5,2 metros e tem uma massa de 1.800 kg.

As cargas transportadas pelo Chang Zheng-5 são inicialmente protegidas por uma carenagem de protecção com um diâmetro de 5,2 metros e um comprimento de 12,5 metros.

Sítio de Lançamentos Espaciais de Wenchang

O Sítio de Lançamentos Espaciais de Wenchang está localizado no canto Nordeste da Ilha de Hainan, na costa Sul da China, e é administrativamente dependente do Centro de Lançamento de Satélites de Xichang.

O complexo de lançamento fornece uma maior versatilidade que não é proporcionada pelos restantes três locais de lançamento (Jiuquan, Xichang e Taiyuan). Wenchang permite um aumento de desempenho para os lançadores que é ganho devido ao facto de se localizar a somente 19.º de latitude do equador terrestre. Isto reduz a quantidade de propelente necessário para o satélite manobrar a partir da sua órbita inicial para a órbita geossíncrona.

Os foguetões podem ser lançados numa direcção a Sudeste para o Pacífico Sul, evitando assim a possibilidade de destroços ou dos estágios caírem sobre zonas populacionais.

Wenchang está equipado com dois complexos de lançamento. O Complexo de Lançamento LC101 é utilizado para a família de foguetões Chang Zheng-5, enquanto o Complexo de Lançamento LC201 é utilizado para os foguetões Chang Zheng-7 e Chang Zheng-8. Ambas as plataformas de lançamento são similares e estão equipadas com uma torre umbilical fixa, fossos e condutas deflectoras de chamas. Tal como acontece nos outros coentros espaciais da China, as torres umbilicais possuem braços amovíveis que permitem o acesso dos técnicos aos diferentes estágios do lançador e à sua carga.

As plataformas de lançamento utilizam um sistema de supressão de ondas de choque, inundando a base da plataforma de lançamento e o fosso deflector das chamas com um grande volume de água para assim diminuir as ondas sonoras geradas pelos motores do veículo.

As plataformas são servidas por dois edifícios de integração e montagem. O Complexo de Lançamento LC101 é servido pelo Edifício 501, enquanto o Complexo de Lançamento LC201 é servido pelo Edifício 502. Cada edifício tem uma altura de 99,4 metros permitindo a montagem e teste do veículo lançador na sua posição vertical já totalmente integrado. Esta é uma nova aproximação à maneira como os lançadores são preparados para as suas missões já que nos restantes centros de lançamento, os foguetões são montados no complexo de lançamento.

Após serem montados no edifício de integração e montagem sobre uma plataforma de lançamento móvel, o conjunto é transportado para o complexo de lançamento. A viagem demora vários minutos a percorrer os 2.800 metros que separam os dois edifícios. Após chegar à plataforma de lançamento, a estrutura móvel é colocada sobre o fosso das chamas e procede-se à ligação das conexões umbilicais entre a estrutura fixa e a plataforma móvel que contém o lançador.