A estação espacial Salyut-7 (II)

A segunda ocupação da Salyut-7

O ano de 1983 deveria ser um ano de sucesso para o programa espacial soviético, porém tal não aconteceu e por duas vezes os seus cosmonautas se encontraram em perigo. A cápsula Soyuz T-8 não conseguiu acoplar com a Salyut-7 devido a um problema no seu mecanismo de acoplagem e os seus três tripulantes não puderam levar a cabo mais uma missão recorde de permanência em órbita. No final de 1983 o foguetão lançador da cápsula que deveria receber a designação de Soyuz T-10 explodiu na plataforma de lançamento com os seus tripulantes a serem salvos pelo sistema de emergência.

Porém, o ano de 1983 assistiu ao lançamento do primeiro módulo orbital a ser acoplado a uma estação espacial. No dia 2 de Março de 1983, às 0937:08UTC, era lançado desde a Plataforma PU-39 do Complexo de Lançamento LC200 do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur o foguetão 8K82K Proton-K (309-02) que colocaria em órbita o veículo TKS-M nº 16401 que receberia a designação Cosmos 1443 (16401 1983-013A) após entrar em órbita terrestre. O Cosmos 1443 (desenho esquemático ao lado) foi colocado numa órbita com um apogeu 261 km, um perigeu de 194 km, inclinação orbital de 51,6.º e período orbital de 89,0 minutos.

Na realidade o Cosmos 1443 era um veículo de transporte TKS que deveria ter sido tripulado na missão TKS-2 (a missão TKS-2 estava prevista para ter lugar em Abril de 1981 e seria tripulada pelos cosmonautas Vladimir Sergeyevich Kozelsky, Yuri Petrovich Artyukhin e Valeri Alexandrovich Romanov) durante o programa espacial militar Almaz OPS-4 cancelado anteriormente. Nesta missão o veículo foi utilizado para transportar carga para a Salyut-7 com a qual acoplou às 0920UTC do dia 10 de Março quando os dois veículos se encontravam numa órbita com um apogeu de 331 km e um perigeu de 292 km.

Soyuz T-8

À tripulação que deveria levar a cabo a segunda ocupação de longa duração da Salyut-7, Vladimir G. Titov e Gennady M. Strekalov, foi adicionado mais um membro, nomeadamente uma cosmonauta, quando os cientistas soviéticos decidiram incluir uma mulher numa missão de longa duração. Assim, Irina R. Pronina foi adicionada à tripulação tendo como suplente o cosmonauta Alexander A. Serebrov. Porém, e devido a pressões políticas internas no programa espacial soviético, começaram a existir grandes esforços para que Pronina não participasse na missão e em Março de 1983, somente a um mês antes do início do voo, ela foi substituída por Alexander Serebrov que tinha como suplente o cosmonauta Viktor P. Savinykh.

Ao lado: A tripulação principal da Soyuz T-8. Da esquerda para a direita: Alexander Alexandrovich Serebrov, Gennady Mikhailovich Strekalov e Vladimir Georgievich Titov. Imagem: Arquivo fotográfico do autor

Segundo Rex Hall e David Shayler na sua obra “Soyuz – A Universal Spacecraft”, algumas fontes ocidentais sugerem que Irina Pronina deveria ter participado numa actividade extraveícular, porém estas actividades estavam designadas para Vladimir Titov e Gennady Strekalov pois foi por esta razão que estes dois cosmonautas seriam rapidamente reciclados para a missão Soyuz T-10 após o fracasso da missão Soyuz T-8. Ainda segundo Hall e Shayler, Strekalov havia referido que “alguém no Comité Central” tinha o receio de que caso de anormal acontecesse durante uma saída para o espaço de Titov e Strekalov, Pronina ficaria sozinha na estação espacial Salyut-7 e não saberia como regressar à Terra, indicando assim o treino limitado que Pronina havia recebido em relação ao veículo Soyuz T.

Os objectivos da missão Soyuz T-8 eram o de permanecer na Salyut-7 entre Abril e Julho de 1983, proceder á utilização do módulo Cosmos 1443 e realizar duas actividades extraveículares para instalarem painéis solares adicionais transportados pelo Cosmos 1443. A Soyuz T-8, com um peso de 6.850 kg, é lançada às 1310:54UTC do dia 20 de Abril de 1983. A cápsula Soyuz 7K-ST nº 13L, que posteriormente recebeu a designação Soyuz T-8, foi lançada pelo foguetão 11A511U Soyuz-U (372) a partir da Plataforma de Lançamento PU-5 do Complexo de Lançamento LC1 (17P32-5) do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur.

A bordo da Soyuz T-8 (13425 1982-080A) encontrava-se o cosmonauta Vladimir Georgievich Titov – Comandante – (118URSS54), o cosmonauta Gennady Mikhailovich Strekalov – Engenheiro de Voo – (98URSS48, 2URSS28-49) e o cosmonauta Alexander Alexandrovich Serebrov – Cosmonauta Pesquisa (110URSS52, 2URSS28-49), utilizando os três homens o nome de código “Okean”. A tripulação suplente era composta por Vladimir Afanasyevich Lyakhov e Alexander Pavlovich Alexandrov e Viktor Petrovich Savinykh.

A Soyuz T-8 é colocada numa órbita com um apogeu a 213 km de altitude e um perigeu a 196 km de altitude, iniciando a perseguição à Salyut-7.

Após se estabelecer na sua órbita inicial a Soyuz T-8 procedeu à realização de alguns testes dos seus sistemas verificando a pressão no interior dos seus módulos, abrindo os painéis solares, etc. Durante estas verificações encontrou-se um problema com a antena do sistema automático de encontro ‘Igla’ que aparentemente não originava qualquer dado no painel de controlo no interior da cápsula. A antena do sistema ‘Igla’ encontra-se armazenada no lançamento por debaixo da ogiva de protecção do lançador 11A511U Soyuz-U e coloca-se em posição logo após a cápsula entrar em órbita terrestre. Os três cosmonautas pensaram que a antena simplesmente não se teria colocado em posição após a entrada em órbita terrestre e tentaram reciclar o sistema para que a antena pudesse instalar-se na sua posição devida. Efectivamente os dados apontavam para o facto de braço da antena se ter movido mas não se ter fixado na sua posição definitiva. Gennady Strekalov sugeriu que a antena pudesse ter ficado presa em algum objecto no exterior da cápsula, sugerindo também a utilização dos pequenos motores do sistema de controlo e reacção para tentar libertá-la. O controlo da missão autorizou este procedimento, mas o seu resultado não foi satisfatório e sem qualquer resultado visível para os três cosmonautas. O controlo da missão indicou que os três homens prosseguissem com o programa de voo estabelecido enquanto que a situação seria avaliada no solo.

A moral dos três cosmonautas encontrava-se em baixo e pouco falavam no interior da Soyuz T-8. Titov esperara muitos anos pelo seu primeiro voo espacial e a ideia de que algo poderia correr mal, trazia um grande desapontamento.

Os três cosmonautas não conseguiram descansar devidamente, pois o problema com o sistema de encontro em órbita significava que não seriam capazes de obter dados relativos à distância e velocidade de aproximação para efectuar uma acoplagem com sucesso à Salyut-7. Após analisarem todos os dados disponíveis, o controlo da missão decidiu prosseguir com o voo e tentar uma acoplagem manual utilizando dados visuais relativos à distância e velocidade de aproximação, pois simulações no solo indicavam que tal era possível.

A aproximação final à Salyut-7 começou quando a Soyuz T-8 se encontrava a 1.000 metros da estação espacial. O principal problema encontrado na aproximação foi a pouca fiabilidade proporcionada pelo indicador de desvio da Soyuz para indicar a distância e a velocidade da cápsula. À medida que a Soyuz T-8 se aproximava da Salyut-7, o tamanho da estação no monitor não alterava, sendo visível como um ponto de luz. À medida que Titov tentava controlar a distância e a velocidade, o controlo da missão pedia-lhe dados sobre o progresso da manobra e fornecia-lhe dados obtidos por computador. Quando Titov referiu o tamanho aparente da Salyut-7 no seu monitor ao controlo da missão, este referiu que a Soyuz T-8 ainda se encontrava muito longe e que deveria accionar o seu motor por 50 segundos. A Salyut-7 começou a aumentar de tamanho no ecrã de Titov, mas este notou que a Soyuz T-8 entraria rapidamente na zona nocturna da sua órbita.

O controlo da missão referia para os cuidados a ter na manobra e para não voarem nem muito rapidamente nem muito perto da estação. Entretanto, a Soyuz T-8 saia da zona de cobertura das estações de rastreio soviéticas e os cosmonautas encontravam-se agora por sua conta. Titov não havia recebido treino para uma acoplagem totalmente manual e era-lhe difícil fazer um julgamento da percepção de profundidade enquanto avaliava a velocidade do veículo.

As luzes de iluminação da Salyut e da Soyuz encontravam-se acesas e os dois veículos iluminavam-se mutuamente, mas Titov encontrava-se receoso de uma colisão. A 280 metros de distância a velocidade de aproximação era muito elevada e Titov fez activar os motores da Soyuz T-8 diminuindo a velocidade. A 160 metros de distância, a partir da qual Titov havia treinado para uma acoplagem manual, a velocidade ainda era demasiado elevada. Os dois veículos encontravam-se na parte nocturna da órbita e nestas condições torna-se muito difícil avaliar a distância e velocidade de aproximação. Com o perigo bastante real de uma colisão, a Soyuz T-8 passou ao lado da Salyut-7 após uma manobra para abortar a acoplagem. Após a manobra de aproximação a Soyuz T-8 ficou colocada numa órbita com um apogeu a 304 km de altitude e um perigeu a 285 km de altitude, enquanto que a Salyut-7 se encontrava numa órbita com um apogeu a 300 km de altitude e um perigeu a 287 km de altitude. Os erros inerentes à determinação visual da distância à Salyut-7 e da velocidade de aproximação eram muito elevados e eliminavam a hipótese de uma nova tentativa de acoplagem. As notícias de um regresso imediato à Terra surgiram a partir do controlo da missão quando a Soyuz T-8 entrou novamente na zona de cobertura das estações de rastreio soviéticas.

Para poupar o combustível existente para a manobra de reentrada atmosférica a Soyuz T-8 foi colocada num modo de estabilização por rotação com os motores de controlo de atitude desligados para conservar combustível. A aterragem teria lugar às 1328:42UTC do dia 22 de Abril de 1983 a 60 km (47º N – 75ºE) a Nordeste da cidade de Arkalyk. A missão Soyuz T-8 teve uma duração de 2 dias 0 horas 17 minutos e 48 segundos, realizando 32 órbitas em torno na Terra.

Uma comissão de inquérito posterior concluiu que a antena teria sido danificada a quando da separação da ogiva de protecção do foguetão lançador.

Alteração de planos

Após a missão Soyuz T-8 as autoridades soviéticas viram-se na necessidade de alterar os planos para os próximos voos espaciais. Assim, os cosmonautas Vladimir Lyakhov e Alexander Alexandrov foram nomeados para a missão Soyuz T-9 com o objectivo de descarregarem o módulo Cosmos 1443, enquanto que Vadimir Titov e Gennady Strekalov foram reciclados para a missão Soyuz T-10 com o objectivo de levarem a cabo as actividades extraveículares necessárias para a instalação dos painéis solares. Lyakhov e Alexandrov seriam então substituídos por Titov e Strekalov na que seria a primeira troca de tripulações em órbita.

A missão de Titov e Strekalov deveria ter uma duração de 3 meses, sendo lançados logo após o regresso do Cosmos 1443, porém a missão seria adiada cerca de 1 mês talvez devido ao facto do veículo a ser utilizado na missão Soyuz T-10 não ser o 7K-ST nº 15L como estava originalmente previsto, mas o 7K-ST n.º 16L. O veículo 7K-ST n.º 15L, o veículo de socorro para a tripulação composta por Vladimir Lyakhov e Alexander Alexandrov, teve de ser transportado de volta para as instalações da NPO Energiya após o problema registado com o veículo 7K-ST nº 14L (Soyuz T-9) como veremos a seguir. O veículo 7K-ST nº 15L teve de ser submetido a verificações adicionais e não pode voar até Fevereiro de 1984, enquanto que o veículo 7K-ST nº 16L foi preparado para a missão de Vadimir Titov e Gennady Strekalov que deveriam ter levado a cabo as suas saídas para o espaço durante o período de troca de tripulações com Lyakhov e Alexandrov a darem apoio na Salyut-7. Porém, estes planos foram alterados quando a Soyuz T-10 encontrou uma das mais graves situações na plataforma de lançamento.

Soyuz T-9

Às 0912:18UTC do dia 27 de Junho de 1983 é lançado desde a Plataforma de Lançamento PU-5 do Complexo de Lançamento LC1 (17P32-5) pelo foguetão 11A511U Soyuz-U (379), o veículo Soyuz 7K-ST nº 14L que receberia a designação Soyuz T-9 (14152 1983-062A) após entrar em órbita terrestre. A Soyuz T-9, com um peso de 6.850 kg, fica colocada numa órbita inicial com um apogeu de 227 km de altitude e um perigeu de 197 km de altitude.

A bordo da Soyuz T-9 encontrava-se o cosmonauta Vladimir Afanasyevich Lyakhov – Comandante – (91URSS45, 2URSS30-52) e o cosmonauta Alexander Pavlovich Alexandrov – Engenheiro de Voo – (123URSS5), utilizando os dois homens o nome de código “Proton” (esta tripulação recebeu também a designação EO-2). A tripulação suplente era composta por Vladimir Georgievich Titov; Gennady Mikhailovich Strekalov.

Após se estabelecerem em órbita terrestre Lyakhov e Alexandrov, juntamente com todo o controlo da missão, aperceberam-se da ocorrência de algo que anteriormente só havia acontecido na missão Soyuz-1, isto é a não abertura de um dos painéis solares da Soyuz T-9 (este facto só foi conhecido em Maio de 2002 quando a revista russa Novosti Kosmonautiki o revelou). No entanto este facto não impediu os dois homens de completarem o encontro e a acoplagem com a Salyut-7. Originalmente a tripulação da Soyuz T-9 teria sido composta por três cosmonautas, mas a necessidade de se transportar mais propolente levou a que a tripulação fosse somente composta por Lyakhov e Alexandrov, e esperava-se que os dois cosmonautas fossem capazes de atingir as metas estabelecidas para a tripulação da Soyuz T-8. A acoplagem entre a Soyuz T-9 e a Salyut-7 tem lugar às 1046UTC com os dois veículos numa órbita com um apogeu a 336 km de altitude e um perigeu a 324 km de altitude. No entanto, Lyakhov e Alexandrov não faziam ideia que a sua missão na Salyut-7 seria muito mais diferente do que haviam imaginado.

Logo após se estabelecerem na Salyut-7, os dois cosmonautas começaram a descarregar o equipamento transportado a bordo do Cosmos 1443. Entre os 3.500 kg de carga transportada incluíam-se painéis solares para aumentar a capacidade energética da estação e que seriam instalados pela tripulação da missão Soyuz T-8 que entretanto fracassara.

A vida a bordo da estação decorria sem problemas, com os cosmonautas instalados na sua rotina diária. Esta rotina seria interrompida a 27 de Julho quando um pequeno objecto de origem desconhecida embateu numa das escotilhas de observação da estação. O impacto criaria uma pequena cratera de 4 mm de diâmetro, sem no entanto penetrar no painel exterior da escotilha. De entre as hipóteses colocadas para a origem do objecto referiu-se a chuva de meteoros Delta Aquaridas, podendo no entanto ter sido um pequeno detrito de lixo espacial em órbita terrestre. Acontecimentos semelhantes seriam recorrentes em futuras missões espaciais tripuladas.

A tripulação da Soyuz T-9. À esquerda o cosmonauta Vladimir Afanasyevich Lyakhov e à direita o cosmonauta Alexander Pavlovich Alexandrov. Imagem: Videocosmos

Pelas 1404UTC do dia 14 de Agosto o módulo Cosmos 1443 separava-se da Salyut-7 transportando 350 kg de material já não necessário a bordo da estação. A cápsula de regresso Merkur do módulo poderia transportar um máximo de 500 kg, porém a bordo da Salyut-7 não havia material para ser descartado. A cápsula de regresso separa-se do módulo de propulsão e serviço do Cosmos 1443 às 1102UTC do dia 23 de Agosto, aterrando na União Soviética minutos mais tarde. Por seu lado, o módulo de serviço e propulsão reentrou na atmosfera sobre o Oceano Pacífico a 19 de Setembro às 0110UTC após ter iniciado às 0023UTC a manobra de reentrada.

No dia 16 de Agosto os dois cosmonautas entram para a Soyuz T-9 e separam-se da Salyut-7. Mantendo-se a uma distância segura os dois homens observam a estação a executar uma manobra de rotação de 180.º e acabam por voltar a acoplar à Salyut-7. Esta manobra foi destinada a libertar o porto de acoplagem para a chegada do cargueiro Progress-17. Às 1208:23UTC do dia 17 de Agosto é lançado desde a Plataforma de Lançamento PU-5 do Complexo de Lançamento LC1 (17P32-5) pelo foguetão 11A511U Soyuz-U (Ts15000-302), o veículo Progress 7K-TG nº 119 que receberia a designação Progress-17 (14283 1983-085A) após entrar em órbita terrestre. O Progress-16, com um peso de 7.020 kg, fica colocado numa órbita inicial com um apogeu de 241 km de altitude e um perigeu de 189 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 (porto posterior) tem lugar às 1347UTC do dia 19 de Agosto quando os dois veículos se encontram numa órbita com um apogeu de 340 km de altitude e um perigeu de 319 km de altitude.

Transportando a habitual carga de alimentos, combustível e materiais para a estação espacial, o Progress-17 estaria envolvido num problema que poderia significar o fim da estação. Durante as operações de abastecimento a principal conduta de oxidante do sistema de propulsão da Salyut-7 sofreu uma ruptura. A seriedade do problema não foi imediatamente entendida pelos observadores ocidentais, no entanto o problema originou que a estação ficasse com somente metade dos seus 32 motores de manobra orbital e tivesse de utilizar os sistemas de propulsão dos cargueiros Progress para manter a sua altitude orbital.

O cargueiro Progress-17 permanece acoplado à Salyut-7 durante 28 dias 21 horas 50 minutos e 24 segundos (o Progress-17 passa um total de 2 dias 13 horas 40 minutos e 48 segundos em voo livre). A separação da Salyut-7 tem lugar às 1144UTC do dia 17 de Setembro e os seus motores são activados às 2343UTC para iniciar a reentrada atmosférica que ocorre às 0030UTC do dia 18 de Setembro.

Regresso ao espaço? – O curto voo da 7K-ST n.º 16L

Colocados no interior da cápsula 7K-ST nº 16L, os cosmonautas Vladimir Georgievich Titov e Gennady Mikhailovich Strekalov (código Okean) seguiam rotineiramente todos os passos que antecipavam um lançamento espacial. A missão espacial seria um lançamento sem muito a relatar num programa de voos já sequenciais para as estações orbitais soviéticas. Titov e Strekalov haviam entrado para a cápsula pelas 1600UTC e o lançamento estava previsto para as 1938UTC. A principal missão dos dois cosmonautas seria a de permanecer duas semanas a bordo da Salyut-7 com Lyakhov e Alexandrov que regressariam à terra depois.

Vladimir Titov (direita) e Gennady Strekalov seguiam rotineiramente todos os passos que antecipavam um lançamento espacial quando o foguetão lançador sofreu uma grave avaria e acabaria por explodir na plataforma de lançamento. Imagem: Arquivo fotográfico do autor

Durante o dia as temperaturas foram amenas no Cosmódromo NIIP-5 Baikonur, atingindo um máximo de 27ºC, descendo para os 10ºC à noite e com ventos a atingir picos entre os 40 km/h e os 43 km/h. A contagem decrescente decorria sem qualquer problema e os dois homens escutavam música transmitida pelo controlo de voo, ao mesmo tempo que conversavam com os cosmonautas encarregues de transmitir todas as ordens e informações do controlo de voo (os cosmonautas Leonid D. Kizim e Vladimir A. Solovyov que constituíam a tripulação suplente).

A T-90s deu-se um problema com uma válvula de combustível do sistema de abastecimento do primeiro estágio que a impediu de fechar e permitindo a fuga de propolente para a base do foguetão 11A511U Soyuz-U colocado na plataforma de lançamento PU-5. A ignição do foguetão encontrava-se eminente e em menos de um minuto dá-se início a um incêndio na base do lançador. As chamas foram aumentando de intensidade e começaram a envolver quase todo o veículo abastecido com mais de 270.000 kg de propolente. O incêndio foi notado pelo director do lançamento a partir de um bunker não muito afastado da plataforma. No interior da cápsula, Titov e Strekalov não possuíam qualquer escotilha que lhes permitisse ver para o exterior pois todas se encontravam encobertas com a ogiva de protecção do foguetão. No entanto os dois homens escutavam a intensa discussão através da ligação rádio que mantinham com o controlo do lançamento.

O sistema de emergência colocado no topo do lançador foi desenvolvido para separar instantaneamente o módulo orbital e o módulo de regresso das cápsulas Soyuz (juntamente com a ogiva de protecção do lançador) do módulo de serviço que é deixado sobre o foguetão. No entanto, e há medida que o fogo se ia propagando consumindo os sistemas que deveriam activar o sistema de emergência. Os controladores do lançamento possuíam escassos segundos para dar início a todo o procedimento para salvar os dois homens no interior da Soyuz. Existia um sistema suplente via rádio, mas o comando deveria ser levado a cabo de forma manual por dois controladores localizados em duas salas distintas situadas no edifício Saturno na Área 23 a 30 km da plataforma de lançamento. Os dois homens deveriam dar início à sequência de salvamento de forma simultânea, sendo esta uma precaução de segurança para evitar qualquer iniciação acidental do sistema. O director do lançamento e o director técnico do veículo lançador deveriam enviar individualmente a palavra código (Dnestr) para o edifício Saturno. Os dois homens encontravam-se em contacto com os dois controladores que deveriam accionar o comando de emergência num espaço de cinco segundos. Todo este procedimento demorava dez segundos e por esta altura o foguetão 11A511U Soyuz-U encontrava-se totalmente envolvido em chamas e prestes a explodir. Após o comando ter sido enviado o pessoal de serviço no Complexo de Medição para o Sistema de Salvamento de Emergência deu início à sequência que acabou por evacuar os dois cosmonautas do topo do lançador.

A separação pirotécnica foi seguida pela ignição dos motores de combustível sólido do sistema de emergência (que ocorre às 1937:47UTC). O conjunto separou-se do lançador em chamas a alta velocidade e num ângulo que originou uma alta aceleração sobre os dois cosmonautas. No interior da Soyuz, Titov havia sentido o foguetão a balançar ao vento e duas ondas de choque provocadas pelas cargas explosivas que haviam separado o módulo de decida do resto do veículo. A força que os empurrava contra os seus assentos e a ausência de ruído dos motores do foguetão Soyuz-U, indicaram que o sistema de emergência havia sido activado e que mais uma vez os dois homens não conseguiriam visitar a Salyut-7. Logo após um voo vertical de três segundos, o conjunto atingia a velocidade do som. A aceleração tivera uma duração total de cinco segundos, mas foi o suficiente para fazer chegar a cápsula a uma altitude de 950 metros. Durante este curtíssimo voo, os dois cosmonautas suportaram uma aceleração máxima entre os 14 g e os 17 g. Seis segundos após a separação da Soyuz do seu lançador, o foguetão explodia numa enorme bola de fogo.

Segundo a corporação Energia passaram 11,2 segundos desde que o fogo foi detectado até à activação do sistema de emergência: 6 segundos para os directores de lançamento compreenderem o que se passava e para transmitirem a palavra de código; 4 segundos para os dois controladores no edifício Saturno enviarem o comando de activação; e 1,2 segundos para o comando ser executado pelos sistemas automáticos da cápsula. Uma explosão inicial ocorre 1 segundo antes da activação do sistema de emergência e nesta altura o lançador já se encontrava inclinado na plataforma de lançamento. O foguetão acabaria por colapsar por completo 4 segundos após a activação do sistema de emergência. O módulo de descida da cápsula 7L-ST nº 16L acabou por aterrar (1943:00UTC) a 5 km a Oeste da plataforma de lançamento que permaneceu em chamas durante 20 horas após a explosão.

Consequências para o programa espacial

O acidente com a missão que se deveria tornar na Soyuz T-10 e que é agora conhecida como Soyuz T-10A (ou Soyuz T-10-1), originou alguns problemas no programa espacial soviético que tiveram de ser resolvidos de forma imediata. Apesar da tripulação não necessitar de cuidados médicos, foi retirada da rotação de voos durante algum tempo. A explosão do foguetão 11A511U Soyuz-U danificou seriamente a plataforma PU-5 do Complexo LC1 e os soviéticos tiveram de iniciar os seus trabalhos de reparação rapidamente, pois a existência de somente uma plataforma de lançamento (PU-6 no Complexo LC31) criava uma pressão nos preparativos e no lançamento da cápsula Soyuz T e dos cargueiros Progress.

O veículo 7K-ST nº 16L deveria ser utilizado para substituir a Soyuz T-9 então em órbita. Anteriormente as trocas de veículos em órbita decorriam em períodos de cerca de 100 dias e por altura do acidente a Soyuz T-9 já havia ultrapassado este período. Este facto levou a que a imprensa ocidental referisse que os dois cosmonautas se encontravam presos no espaço e sem um meio de regresso à Terra, surgindo mesmo rumores de que a União Soviética havia solicitado aos Estados Unidos a realização de um voo de emergência de um dos seus vaivéns espaciais para salvar os dois homens. Obviamente que tudo não passava de rumores, pois o limite de 100 dias atribuído ás cápsulas Soyuz T não era verdadeiro e não havia qualquer razão para os veículos não fossem utilizados em órbita pata lá desse limite. Na realidade a Soyuz T poderia ficar em órbita durante 180 dias e a Soyuz T-9 nunca ultrapassou este limite mesmo com o prolongamento do seu voo.

Entretanto a bordo da Salyut-7 a montagem dos painéis solares adicionais, que deveria ter sido levada a cabo por Titov e Strekalov, foi levada a cabo por Lyakhov e Alexandrov. Os sistemas da Salyut-7 levantaram mais preocupações aos seus controladores quando surgiu um problema no seu sistema de controlo ambiental que causou um cheiro acre (que fez lembrar um problema semelhante ocorrido na estação espacial Salyut-5). A temperatura interna da estação baixara para os 18ºC e a sua humidade subira para os 100%. Todos estes problemas teriam de ser resolvidos pela seguinte tripulação a permanecer na Salyut-7.

Em Setembro de 1983 são formadas cinco tripulações, sendo que três destas tripulações treinariam para uma missão de longa duração na Salyut-7. As tripulações para a missão de longa duração EO-3 são constituídas por: Leonid Denisovich Kizim, Vladimir Alexeievich Solovyov e Oleg Yurievich Atkov, sendo a segunda tripulação constituída por Vladimir Vladimirovich Vasyutin, Viktor Petrovich Savinykh e Valeri Vladimirovich Polyakov. Uma terceira tripulação é composta por Alexander Stepanovich Viktorenko e Vitali Ivanovich Sevastyanov. Por outro lado, duas tripulações levam a cabo treinos para uma curta visita (EP-3) à Salyut-7 incluídas numa missão conjunto indo-soviética: Yuri Vasilievich Malyshev, Nikolai Nikolaievich Rukavishnikov e Rakesh Sharma, sendo a segunda tripulação constituída por Anatoli Nikolaievich Berezovoi, Georgi Mikhailovich Grechko e Ravish Malhotra.

Às 0959:05UTC do dia 20 de Outubro é lançado desde a Plataforma de Lançamento PU-6 do Complexo de Lançamento LC31 (17P32-6) pelo foguetão 11A511U Soyuz-U (Ts15000-287), o veículo Progress 7K-TG n.º 118 que receberia a designação Progress-18 (14422 1983-106A) após entrar em órbita terrestre. O Progress-18, com um peso de 7.020 kg, fica colocado numa órbita inicial com um apogeu de 242 km de altitude e um perigeu de 184 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 (porto posterior) tem lugar às 1347UTC do dia 22 de Outubro quando os dois veículos se encontram numa órbita com um apogeu de 357 km de altitude e um perigeu de 318 km de altitude. O Progress-18 transporta a habitual carga de mantimentos, água, combustível, ar, oxigénio e outros materiais para os cosmonautas.

Os trabalhos de colocação dos painéis solares no exterior da Salyut-7 iniciam-se a 1 de Novembro. A saída para o espaço inicia-se às 0447UTC e os dois homens (Alexandrov envergava o fato extraveícular Orlan-D nº 46 enquanto que Lyakhov envergava o fato extraveícular Orlan-D nº 45) procedem à colocação e substituição de células solares no painel solar central da estação espacial. Esta substituição é necessária por se ter verificado anteriormente uma rápida degradação dos painéis solares da Salyut-6. A degradação dos painéis solares ocorre devido à constante exposição aos raios ultravioleta e ao oxigénio atómico existente há altitude da órbita das estações soviéticas. Com o lançamento da Salyut-7 foi decidido que a nova estação teria a capacidade dos seus ocupantes puderem restabelecer a produção de energia eléctrica. Durante os preparativos para a actividade extraveícular, Alexandrov descobriu uma pequena fuga no seu fato espacial que foi, no entanto, remediada pelos dois cosmonautas tendo o fato desempenhado a sua função sem qualquer problema.

As extensões dos painéis solares foram transportadas para a Salyut-7 pelo Cosmos 1443 e estes painéis solares deveriam ter sido originalmente colocados pelos cosmonautas Titov e Strekalov, mas devido aos problemas encontrados para chegar à estação espacial os controladores russos decidiram que Lyakhov e Alexandrov iriam levar a cabo essa tarefa devido à crescente diminuição na produção de energia pelos painéis solares.

Nesta actividade extraveícular, Lyakhov tonou-se no primeiro soviético a realizar duas saídas para o espaço. No início da saída para o espaço, Alexandrov montou uma câmara de televisão num braço móvel para que os controladores no solo pudessem seguir todos os passos dos dois cosmonautas. De seguida os dois homens colocaram-se em posição utilizando sistemas de fixação nos seus pés denominados Yakor colocados na base dos painéis solares para se poderem fixar à fuselagem da estação, facilitando assim os seus trabalhos e removeram o painel solar do seu contentor de transporte. Estas actividades foram supervisionadas pelo cosmonauta Valeri Ryumin a partir do Centro e Controlo TsUP.

Pelas 0527UTC os dois homens ficaram fora da zona de comunicações com o controlo da missão e com os navios de comunicações colocados em algumas zonas do planeta. Muito deste tempo sem qualquer comunicação foi passado na zona nocturna da órbita da Salyut-7. Após serem restabelecidas as comunicações às 0617UTC, os dois cosmonautas utilizaram uma chave de fendas compacta para abrirem e instalarem o painel ao longo de um painel já existente. No total foram necessárias 48 operações para montar o painel solar (seriam necessárias 189 operações para montar o painel numa situação de contingência). O painel solar, com um comprimento de 5 metros e uma largura de 1,5 metros, proporcionou um aumento de 25% no total de energia disponível para a estação espacial. Durante a actividade extraveícular os dois cosmonautas foram repreendidos pelo TsUP por terem libertado em órbita pedaços de lixo espacial só para os verem afastar-se da estação. O TsUP argumentou que os detritos poderiam interferir com os sensores estelares da Salyut-7. A saída para o exterior termina às 0737UTC após permanecerem no vácuo durante 2 h 49 m.

A segunda actividade extraveícular tem início às 0347UTC do dia 3 de Novembro e foi basicamente uma repetição da primeira saída para o exterior da Salyut-7 (Alexandrov envergava o fato extraveícular Orlan-D nº 46 enquanto que Lyakhov envergava o fato extraveícular Orlan-D nº 45).

Esta foi a primeira vez que cosmonautas soviéticas realizaram uma segunda actividade extraveícular na mesma missão espacial. A saída para o exterior da Salyut-7 foi planeada para que as suas actividades principais decorressem quando a estação se encontrasse na parte diurna da sua órbita e em contacto com o controlo da missão. Os dois painéis solares colocados pelos dois cosmonautas aumentaram a capacidade da estação em 800W. Com uma duração de 2 horas e 55 minutos, esta saída para o espaço termina às 0642UTC. Com os novos painéis solares a electricidade disponível a bordo da estação é aumentada em 50%.

Segundo Viktor Blagov, Director Geral do TsUP na altura da realização destas actividades extraveículares, estas saídas para o espaço foram importante por duas razões: “as baterias solares perdem gradualmente a sua produtividade quando operam no espaço exterior por longos períodos de tempo… (enquanto ao mesmo tempo) são enviados para órbita instrumentos que requerem mais e mais energia. As operações de instalação actuais são os primeiros passos na resolução dos problemas da energia em órbita com os quais nos deparamos…em segundo lugar, apesar de todos os trabalhos de manutenção que têm sido levados a cabo anteriormente no espaço exterior, não têm sido levadas a cabo operações de instalação de grandes estruturas. Não está longe o tempo no qual brigadas de trabalhadores irão voar para a órbita terrestre e construir grandes complexos orbitais no espaço. (Lyakhov e Alexandrov) já provaram que tudo isto é completamente possível.

Os cosmonautas Leonid Kizim e Vladimir Solovyov simularam simultaneamente os trabalhos de Lyakov e Alexandrov na instalação de flutuação neutra da Cidade das Estrelas. Num artigo publicado em 1984, Lyakhov e Alexandrov descreveram os dois cosmonautas como os “pilotos de teste que nos treinaram” e disseram “que caso surgisse alguma dificuldade, a equipa no solo poderia fornecer-nos assistência com as suas recomendações.”

A 4 de Novembro os motores do Progress-18 são utilizados para elevar a órbita da Salyut-7 colocando-a com um apogeu de 356 km de altitude e um perigeu de 326 km de altitude. No dia 10 de Novembro toda a carga havia sido retirada do interior do cargueiro. Às 0308UTC do dia 13 de Novembro o cargueiro Progress-18 separa-se da Salyut-7 e às 0418UTC do dia 16 de Novembro os seus motores são activados para iniciar a reentrada atmosférica que ocorre minutos mais tarde. O cargueiro permanece acoplado à Salyut-7 durante 21 dias 15 horas 36 minutos e 00 segundos, passando um total de 5 dias 2 horas 38 minutos e 24 segundos em voo livre.

Entretanto no dia 14 de Novembro a órbita da estação é baixada para um apogeu a 337 km de altitude e um perigeu a 322 km de altitude, executando-se assim um teste de fiabilidade da Soyuz antes do regresso à Terra.

Vladimir Lyakhov e Alexander Alexandrov deixam a Salyut-7 às 1640UTC do dia 23 de Novembro e regressam à Terra às 1958:19UTC, após um voo com uma duração de 149 dias 10 horas 41 minutos 1 segundo. A aterragem tem lugar a 160 km a Este de Dzhezkazgan.

1984, um ano de sucesso para a Salyut-7

Ao contrário de 1983, o ano de 1984 seria um ano de sucesso para a Salyut-7 que veria um novo recorde de permanência em órbita e receberia a visita de duas tripulações entre as quais a do primeiro cosmonauta indiano e a segunda visita de Svetlana Savitskaya que realizaria a primeira actividade extraveícular feminina.

Após o regresso da Soyuz T-9 a União Soviética informava que iria ocorrer um ligeiro atraso até ao lançamento da próxima missão tripulada enquanto que os resultados da última missão fossem avaliados, mais precisamente a análise do módulo de regresso após uma estadia tão prolongada em órbita. Sem dúvida que a investigação ao acidente da Soyuz T-10A, o estado da Salyut-7 a disponibilidade de um novo veículo 7K-ST e de um novo lançador, levaram ao possível adiamento da seguinte missão.

A tripulação da missão Soyuz T-10. Da esquerda para a direita: Oleg Yurievich Atkov, Leonid Denisovich Kizim e Vladimir Alexeievich Solovyov. Kizim e V. Solovyov levariam a cabo importantes reparações na Salyut-7, enquanto que Atkov levaria a cabo uma extensiva pesquisa médica. Imagem: Arquivo fotográfico do autor

A 3 de Outubro de 1983 são nomeadas as tripulações para a seguinte fase de ocupação da estação Salyut-7 que começará em Fevereiro de 1984. Em Dezembro tem também início o treino de mais uma tripulação de curta duração constituída pelos cosmonautas Vladimir Alexandrovich Dzhanibekov, Svetlana Yevgenievna Savitskaya e Igor Petrovich Volk

O lançamento da missão Soyuz T-10 (veículo Soyuz 7K-ST nº 15L) tem lugar às 1207:26UTC do dia 8 de Fevereiro de 1984. O lançamento é levado a cabo desde a Plataforma PU-6 do Complexo de Lançamentos LC31 (17P32-6) do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur por um foguetão 11A511U Soyuz-U. Após entrar em órbita terrestre a Soyuz T-10 recebe a Designação Internacional 1984-014A e o número de catálogo orbital 14701. A cápsula é colocada numa órbita inicial com um apogeu a 219 km de altitude e um perigeu a 198 km de altitude. A acoplagem com a estação espacial Salyut-7 tem lugar às 1443UTC do dia 9 de Fevereiro.

A Soyuz T-10 é tripulada pelos cosmonautas Leonid Denisovich Kizim (98URSS48; 2URSS31-55), Vladimir Alexeievich Solovyov (136URSS56) e Oleg Yurievich Atkov (136URSS56), que utilizam o nome de código ‘Mayak’. A tripulação suplente é composta pelos cosmonautas Vladimir Vladimirovich Vasyutin, Viktor Petrovich Savinykh e Valeri Vladimirovich Polyakov.

A missão da terceira tripulação de longa duração na Salyut-7 (EO-3) tinha três objectivos principais: a reparação da fuga de combustível no sistema de propulsão da Salyut-7, o estabelecimento de um novo recorde de permanência no espaço e a realização de um programa de experiências médicas e de observações.

Após a acoplagem os três cosmonautas penetraram na Salyut-7 utilizando lanternas eléctricas, comentando sentir o cheiro do metal queimado do mecanismo de acoplagem. No dia 17 de Fevereiro todos os sistemas da estação espacial estavam operacionais e os cosmonautas haviam já estabelecido a sua rotina diária em órbita. O cosmonauta Oleg Atkov mantinha uma monitorização constante da sua saúde e dos seus companheiros. As tarefas de limpeza e manutenção da estação estavam a cargo de Atkov, enquanto que Leonid Kizim e Vladimir Solovyov levavam a cabo as experiências a bordo da estação.

Por esta altura, tem início o treino de mais uma tripulação de curta duração. Esta tripulação (EP-4) é constituída por Vladimirovich Vasyutin, Viktor Petrovich Savinykh e Yekaterina Alexandrovna Ivanova.

O cosmonauta Nikolai Nikolaievich Rukavishnikov é também removido de uma das tripulações indo-soviéticas devido a problemas de saúde sendo substituído pelo cosmonauta Gennady Mikhailovich Strekalov.

Com a estação operacional, estava na altura de se proceder ao lançamento de mais um cargueiro para a estação. Às 0646:05UTC do dia 21 de Fevereiro é lançado desde a Plataforma de Lançamento PU-6 do Complexo de Lançamento LC31 (17P32-6) por um foguetão 11A511U Soyuz-U, o veículo Progress 7K-TG nº 120 que receberia a designação Progress-19 (14757 1984-018A) após entrar em órbita terrestre. O Progress-19, com um peso de 7.020 kg, fica colocado numa órbita inicial com um apogeu de 245 km de altitude e um perigeu de 185 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 (porto posterior) tem lugar às 0821UTC do dia 23 de Fevereiro quando os dois veículos se encontram numa órbita com um apogeu de 286 km de altitude e um perigeu de 282 km de altitude. O Progress-19 transporta a habitual carga de mantimentos, água, combustível, ar, oxigénio e outros materiais para os três cosmonautas. O Progress-19 permanece acoplado à Salyut-7 durante 37 dias 1 hora e 12 minutos, separando-se às 0940UTC do dia 31 de Março. Às 1818UTC do dia 1 de Abril os seus motores são accionados para dar início à reentrada atmosférica que tem lugar pelas 1905UTC (no total o cargueiro permanece 3 dias 10 horas 19 minutos e 12 segundos em voo livre).

Os três cosmonautas a bordo da Salyut-7 preparam-se para receber os seus primeiros visitantes quando a 3 de Abril é colocada em órbita a cápsula 7K-ST nº 17L que recebe a designação de Soyuz T-11 (14872 1984-032A). O lançamento é levado a cabo às 1308:38UTC por um foguetão 11A511U Soyuz-U a partir da Plataforma PU-6 do Complexo de Lançamento LC31 (17P32-6) do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur. A Soyuz T-11 é colocada numa órbita inicial com um apogeu a 223 km de altitude e um perigeu a 196 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 tem lugar às 1431UTC do dia 4 de Abril quando os dois veículos se encontravam numa órbita com um apogeu a 296 km de altitude e um perigeu a 284 km de altitude.

A bordo da Soyuz T-11 seguem os cosmonautas Yuri Vasilievich Malyshev (95URSS47; 2URSS32-56) Gennady Mikhailovich Strekalov (98URSS48; 2URSS28-49; 3URSS13-21) e Rakesh Sharma (138IND1). A tripulação escolhe o nome de código ‘Yupiter’ e tem como tripulação suplente os cosmonautas Anatoli Nikolaievich Berezovoi, Georgi Mikhailovich Grechko e Ravish Malhotra.

Durante sua permanência na Salyut-7 a tripulação da Soyuz T-11 levou a cabo um programa de experiências científicas, estudos técnicos e observações do planeta, enquanto que Rakesh Sharma levava a cabo um programa de observação da Índia e realizava estudos no âmbito das ciências da vida e processamento de materiais. Sharma tornar-se-ia no primeiro a realizar práticas de yoga em órbita terrestre.

Ao lado: A tripulação da missão Soyuz T-11. Da esquerda para a direita: Yuri Vasilievich Malyshev, Rakesh Sharma e Gennady Mikhailovich Strekalov. Sharma seria o primeiro cosmonauta indiano e o primeiro a praticar yoga no espaço. Imagem: Arquivo fotográfico do autor

Malyshev, Strekalov e Sharma regressariam à Terra a bordo da Soyuz T-10 que se separaria da Salyut-7 às 0733UTC do dia 11 de Abril e aterrava às 1048:44UTC a 45 km Este de Arkalyk, após um voo com uma duração de 7 dias 21 horas e 36 minutos. A aterragem tem lugar 1 minuto antes do previsto e apenas a 1 km do local previamente assinalado. A cápsula aterra na posição vertical em vez de aterrar de lado como era usual, mas não normal para as Soyuz. O voo de Malyshev, Strekalov e Sharma teve uma duração de 7 dias 21 horas 40 minutos e 6 segundos.

Às 1027UTC do dia 13 de Abril os três cosmonautas da tripulação permanente da Salyut-7 embarcam na Soyuz T-11 e separam-se da estação. A uma distância segura aguardam que a Salyut-7 execute uma manobra de rotação de 180º antes de voltarem a acoplar, libertando assim o porto de acoplagem posterior para a chegada do cargueiro Progress-20 (Progress 7K-TG nº 121) que foi lançado às 0812:53UTC do dia 15 de Abril por um foguetão 11A511U2 Soyuz-U2 a partir da Plataforma PU-6 do Complexo de Lançamentos LC31 (17P32-6) do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur. Após entrar em órbita terrestre o Progress-20 recebe a Designação Internacional 1984-032A e o número de catálogo orbital 14932. O Progress-20 é colocado numa órbita inicial com um apogeu a 230 km de altitude e um perigeu a 186 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 tem lugar ás 0922UTC do dia 17 de Abril quando ambos os veículos se encontram numa órbita com um apogeu a 290 km de altitude e um perigeu a 278 km de altitude.

Lançamento da Soyuz T-11

Para além da carga habitual de mantimentos, consumíveis, ar, oxigénio e combustível, o Progress-20 transporta uma escada especial que permitirá o acesso à área onde se localiza a anomalia nas condutas de abastecimento do sistema de propulsão da Salyut-7. O módulo orbital do cargueiro foi também equipado com uma extensão especial possuindo módulos de fixação para os pés e com 25 contentores para ferramentas especiais.

Ao lado: O cosmonauta Oleg Atkov recolhe amostras sanguíneas do cosmonauta indiano Rakesh Sharma a bordo da Salyut-7. Imagem: Arquivo fotográfico do autor

A primeira saída para o espaço de Kizim (Orlan-D nº 45) e V. Solovyov (Orlan-D nº 47) tem lugar a 23 de Abril. Nas actividades extraveículares realizadas por Kizim e V. Solovyov, os dois homens utilizaram sempre os fatos extraveículares Orlan-D nº 45 e Orlan-D nº 47, respectivamente. Pelas 0431UTC os dois homens abrem a escotilha de acesso ao exterior da estação orbital e começam a dirigir-se para o local de trabalho. Nesta primeira actividade extraveícular os dois homens procederam à colocação de uma escada de acesso e prepararam o local de trabalho para as reparações. Às 0846UTC, e após 4 horas e 15 minutos no exterior da estação, os dois homens regressavam à Salyut-7. A segunda saída para o espaço iniciava-se às 0240UTC do dia 26 de Abril. Após chegarem ao local de trabalho os dois homens tiveram de cortar o isolamento térmico da Salyut-7 e penetraram na fuselagem da estação para terem acesso ás condutas. Os dois cosmonautas colocaram uma válvula na conduta de reserva antes de regressarem ao interior da estação após 4 horas e 56 minutos de trabalho no exterior, encerrando a escotilha às 0736UTC. A 29 de Abril regressavam de novo ao local de trabalho no exterior da estação para instalarem uma conduta alternativa que substituiu a secção afectada. Esta terceira saída para o espaço teve início às 0135UTC e terminou às 0420UTC, após permanecerem 2 horas e 45 minutos no exterior. Uma quarta saída para o espaço teve lugar a 3 de Maio e foi destinada a colocar uma segunda conduta. No entanto os trabalhos não foram finalizados porque os dois homens não possuíam as ferramentas necessárias para a sua execução, nomeadamente para encerrar a ligação da nova conduta. Nesta saída para o espaço, que teve início às 2315UTC, os dois cosmonautas procederam também à colocação de uma nova camada térmica isoladora na fuselagem da estação. Esta saída para o espaço foi finalizada às 0230UTC do dia 4 de Maio após 2 horas e 45 minutos.

Às 1746UTC do dia 6 de Maio o cargueiro Progress-20 separou-se da Salyut-7 após permanecer acoplado durante 19 dias 8 horas e 24 minutos à estação. A manobra de reentrada é iniciada às 0032UTC do dia 7 de Maio com a activação dos motores do veículo que reentra na atmosfera terrestre pelas 0115UTC (no total o Progress-20 permaneceu 2 dias 7 horas 55 minutos e 12 segundos). Neste mesmo dia dá-se o lançamento do cargueiro Progress 7K-TG nº 116 que recebe a designação Progress-21 (14961 1984-042A) após entrar em órbita terrestre. O lançamento tem lugar às 2247:15UTC e é levado a cabo por um foguetão 11A511U Soyuz-U a partir da Plataforma PU-6 do Complexo de Lançamentos LC31 (17P32-6) do Cosmódromo NIIP-5 Baikonur. O Progress-21 é colocado numa órbita inicial com um apogeu a 243 km de altitude e um perigeu a 190 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 tem lugar às 0010UTC do dia 10 de Maio quando os dois veículos se encontram numa órbita com um apogeu a 316 km de altitude e um perigeu a 276 km de altitude. A bordo do Progress-21 foram transportados duas extensões para os painéis solares com uma área de 9 m2, similares aos que haviam já sido adicionados anteriormente.

A 18 de Maio Kizim e V. Solovyov levam a cabo mais uma saída para o exterior da Salyut-7 com o intuito de instalarem as extensões no painel solar direito da estação. A saída para o exterior tem início às 1752UTC e terminar às 2057UTC após 3 horas e 5 minutos de trabalhos. Durante a actividade extraveícular Oleg Atkov permanece no interior da estação e comanda a rotação do painel solar de forma a colocar em posição a zona na qual os cosmonautas iriam trabalhar. Durante as operações de colocação dos novos painéis partiu-se o dispositivo manual que servia para elevar o painel, mas os dois homens foram capazes de finalizar as operações.

O Progress-21 permanece acoplado à Salyut-7 durante 16 dias 9 horas e 36 minutos, separando-se às 0941UTC do dia 26 de Maio (no total o cargueiro executa 2 dias 6 horas 43 minutos e 12 segundos). Os seus motores são activados às 1501UTC e é iniciada a manobra de reentrada atmosférica que ocorre por volta das 1545UTC.

Às 1412:52UTC do dia 28 de Maio é lançado desde a Plataforma de Lançamento PU-6 do Complexo de Lançamento LC31 (17P32-6) pelo foguetão 11A511U Soyuz-U, o veículo Progress 7K-TG nº 122 que receberia a designação Progress-22 (14996 1984-051A) após entrar em órbita terrestre. O Progress-22, com um peso de 7.020 kg, fica colocado numa órbita inicial com um apogeu de 244 km de altitude e um perigeu de 188 km de altitude. A acoplagem com a Salyut-7 (porto posterior) tem lugar às 1457UTC do dia 30 de Maio quando os dois veículos se encontram numa órbita com um apogeu de 358 km de altitude e um perigeu de 334 km de altitude. O Progress-22 transporta a habitual carga de mantimentos, água, combustível, ar, oxigénio e outros materiais para os cosmonautas. O cargueiro permanece acoplado à estação durante 45 dias 21 horas 50 minutos e 24 segundos (com um total de 2 dias 6 horas 43 minutos e 12 segundos de voo livre), separando-se da Salyut-7 às 1336UTC do dia 15 de Julho. Os seus motores são activados às 1852UTC e a reentrada atmosférica dá-se às 1935UTC.

(Continua)